São Paulo, sábado, 18 de julho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LETRAS JURÍDICAS
Físicos e juristas

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

Assisti, faz pouco tempo, a um debate entre economistas coordenado por Luís Nassif no qual se discutiram o Plano Real e seus efeitos, recolhendo opiniões da oposição e do governo. Saí animado, pois os economistas, embora lidem com dados exatos, são capazes de interpretações conflitantes a respeito de qualquer assunto, assim como nós, advogados e jornalistas.
Nassif, aliás, retratou o debate em comentário, no qual disse que nenhum dos presentes, ele no meio, tinha idéia, "além da observação empírica, sobre como fatores políticos e sociais se entrelaçam, como se cria um ambiente de desenvolvimento, como se reproduzem experiências vitoriosas de articulação da cadeia produtiva em outras partes do país, qual o peso das mudanças culturais na formação desse ambiente".
No fundo da sala, onde fiquei ouvindo e matutando, descobri que os fenômenos econômicos contemporâneos são, tanto quanto os fenômenos jurídicos, difíceis de compreender, explicar e catalogar, em face da globalização e dos conceitos relativos a ela.
Assim tem sido, no campo da soberania, da sobrevivência do Estado moderno como órgão de controle social, da transnacionalidade dos grandes grupos econômicos, da dificuldade de bem representar as sociedades locais diante desses grupos nos termos da lei interna de cada país.
A luta pela recomposição da economia russa (exemplificando acontecimentos no antigo bloco soviético), a transformação dos tigres asiáticos em bichanos insolváveis ou quase, os sustos em nível de escala Richter pregados pelo Japão, o efeito dos saltos das bolsas planetárias, tudo isso dá margem para tanta opinião econômica que é sempre possível encontrar um economista que diga o que a gente quer ouvir.
O comentário de Nassif me despertou muitas idéias quando disse que, "no Brasil, os físicos vêm ocupando cada vez mais cargos-chave e tendo papel central" na reavaliação da ciência econômica, com novas formas de pensar e contribuições que vão até a teoria do caos.
Peguei o "gancho" para reavaliar o direito como ciência social. Social é, sem dúvida. Mas sua aceitação como ciência não é universal, tantas as suas variáveis não objetivas. Em contrapartida, a física é ciência exata. Permite a definição dos fenômenos examinados, sem alternativas. Mas será assim mesmo? A teoria da relatividade, que embasbacou o começo do século, se for verdadeira, terá superado as leis de Newton. Tudo bem, dirão outros, a física pode passar por transformações, mas, ainda assim, não é a barafunda dos assuntos jurídicos na qual o dia-a-dia mostra decisões judiciais contraditórias, estimula o grande número dos excluídos, gera queixas de que a Justiça oficial é uma espécie de farsa formal.
Indo, porém, à história, verifica-se uma espécie de constante matemática a favor do direito. Embora os fatores jurídicos variassem ao longo do tempo, as críticas contra a aplicação deles também variaram, na mesma proporção, para os mesmos efeitos. Percorrida a literatura, relidas sátiras, vistos autores e narrativas de origens as mais diversas, os advogados, os juízes, com suas qualidades e seus defeitos, assim como a lentidão e a complicação, sempre existiram. O gênio físico de Max Planck, ao tratar da proporcionalidade da energia das partículas e das frequências de onda ligadas às mesmas partículas, não teria encontrado constante definida com maior precisão do que a do direito. Por tudo isso, concluo: Os físicos podem ajudar a economia, mas duvido que tenham boa contribuição para o direito.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.