São Paulo, sábado, 19 de setembro de 1998

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LEIS

Autoridades de trânsito não respeitam novo código

EUNICE NUNES
especial para a Folha

As autoridades de trânsito estão em débito com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), um ano após sua publicação.
Não estão estruturadas de acordo com a nova lei, não estão aplicando o dinheiro obtido com as multas exclusivamente em equipamentos, fiscalização e educação de trânsito, nem estão executando todas as novas regras vigentes.
"A preocupação prioritária das autoridades tem sido a arrecadação. A função educativa do novo código ainda não saiu verdadeiramente do papel", alerta o desembargador Geraldo Pinheiro, especialista em legislação de trânsito.
Exemplo disso é o artigo que trata de estacionamento proibido. Ele estabelece como medida administrativa a remoção do veículo e como penalidade a multa.
"A remoção do veículo tem um efeito mais educativo do que a simples imposição de multa. Só que as autoridades não removem os veículos alegando que não há espaço para guardá-los. Esse é um serviço que poderia ser terceirizado e levaria os motoristas a pensar dez vezes antes de estacionar em local proibido", avalia Pinheiro.
Outro exemplo dessa fúria arrecadadora está num contrato que terceiriza a fiscalização eletrônica firmado entre o Departamento Estadual de Trânsito do Mato Grosso do Sul (Detran-MS) e a empresa Fotossensores Tecnologia Eletrônica Ltda.
A cláusula sétima desse contrato diz que a partir do segundo equipamento instalado pela empresa Fotossensores, a instalação dos demais fica condicionada à geração de uma quantidade mínima de 150 registros de infração mensais por equipamento.
E mais, diz que, se ficar configurada a inviabilidade econômica do negócio, representada por um volume médio inferior a 150 infrações mensais por equipamento por três meses consecutivos, a empresa contratada é autorizada a retirar os equipamentos responsáveis pelo não-atingimento da cota média estabelecida.
"É a mesma coisa que fixar quantos inquéritos policiais a delegacia tem que instaurar por mês, sob pena de fechá-la. Como é que, por antecedência, se pode prever quantos crimes ou infrações serão cometidos?", compara José Carlos Robaldo, procurador de Justiça em Campo Grande (MS).
Ainda em relação à arrecadação, o CTB diz que a receita das multas será aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito.
Mas são as prefeituras que controlam essa receita e não há fiscalização sobre sua aplicação. Em São Paulo, a prefeitura chegou a pensar em lançar debêntures (títulos de crédito) lastreadas na arrecadação de multas de trânsito.
Quanto à educação de trânsito, continua como um sonho romântico do legislador.
As escolas públicas de trânsito não saíram do campo das intenções do novo código. O mesmo acontece com a educação para o trânsito a ser ministrada da pré-escola ao 3º grau, mediante currículo interdisciplinar.



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