São Paulo, sábado, 19 de setembro de 1998

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VIOLÊNCIA
Garota, cuja gestação completa 4 meses, afirma que era estuprada sistematicamente por dois vizinhos desde os 7
Juiz autoriza grávida de 10 anos a abortar

MALU GASPAR
da Reportagem Local

A menina C.B.S, 10, grávida de quatro meses, foi autorizada legalmente a abortar na semana passada, por um juiz da cidade de Israelândia, em Goiás, onde ela mora com os pais. Desde os 7 anos, C. era estuprada sistematicamente por dois vizinhos, um de 52 e outro de 65 anos.
Foi a própria garota, apoiada pela família, quem decidiu que não quer ter o filho, diz o juiz de Israelândia, João Geraldo Machado, que assinou a sentença.
A decisão de Machado está apoiada em laudos de dois médicos peritos, que sustentam que o aborto é tão arriscado quanto a continuidade da gestação.
C. é descrita tanto pelo delegado que apurou o caso como pelo juiz como uma menina franzina e frágil, com cerca de 1,40 m de altura e cerca de 30 kg. Ela está matriculada na 3ª série do ensino fundamental numa escola pública local.
A gravidez só foi descoberta no mês passado, depois que a menina começou a passar mal e foi levada ao posto médico da cidade. Ali, a tia de C. descobriu que ela estava com aproximadamente três meses de gravidez.
Segundo o juiz João Geraldo Machado, que deu a autorização para o aborto, tanto a menina quanto os pais estavam irredutíveis na decisão de interromper a gravidez.
"Para eles, tirar esse bebê é um alívio. A própria C. disse que a criança foi feita à força e que não quer que ela nasça."
Machado conta que ele próprio chegou a oferecer ajuda financeira para o tratamento médico e para o enxoval, mas a família não aceitou. "Sou radicalmente contra o aborto, mas nesse caso acho que a sentença foi justa. Só quem está vivendo esse drama sabe o que sofre", diz o juiz.
Segundo a investigação policial sobre o caso, os estupros ocorriam constantemente, dia sim, dia não, num barraco vizinho ao de C., na periferia de Israelândia, que fica 192 km a oeste de Goiânia.
Uma amiga, N., de 11 anos hoje, 8 na época, contou que ia buscar C. depois que os pais saíam para trabalhar, levava a amiga ao barraco e ficava vigiando do lado de fora. N. disse que fazia isso a pedido dos Benedito Soares Souza, 65 e de José Benedito Afonso, 52. Depois do estupro, as meninas ganhavam R$ 1,00 e um saco de bolachas, diz o delegado Antônio Machado de Azevedo, investigou o caso.
Os dois acusados tiveram prisão preventiva decretada e estão encarcerados na delegacia de Itaporá, a 25 km dali. Segundo o juiz de Israelândia, a família de C. está revoltada com o que aconteceu com a menina e transtornada com a repercussão do caso na vizinhança da cidade, que tem 2.500 habitantes. C.B.S tem dois irmãos. A mãe recebe R$ 90 ao mês e o pai está desempregado.



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