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São Paulo, segunda-feira, 20 de outubro de 2003

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SAÚDE BUCAL

Somente 4,31% dos procedimentos realizados são de alta complexidade; adolescentes e adultos são excluídos

Assistência estatal é limitada a extrações

DA REPORTAGEM LOCAL

Resumo de uma dívida de 50 anos do Estado com a saúde bucal dos brasileiros: no horário nobre, atrizes globais anunciam, em uma atmosfera de glamour, fixadores e limpadores de dentaduras.
"Sabemos que a cada 4 brasileiros que completam 60 anos, 3 não têm um dente na boca", afirma o coordenador de Saúde Bucal do Ministério da Saúde, Gilberto Alfredo Pucca Júnior. Os dados são de São Paulo, da tese de doutorado defendida por Pucca Júnior em 1998, mas ele afirma que podem ser projetados para o restante do país. "É escandaloso. O desafio é estender a universalidade e a integralidade a todos."
Nunca houve uma política de saúde bucal ampla. Historicamente, adolescentes, adultos e idosos foram excluídos dos programas governamentais, iniciados na década de 50, com uma ação para escolares em Aimorés (MG), em 1951, e a fluoretação em Baixo Guandu (ES, 1953). Os dois trabalhos foram desencadeados pelo Sesp (Serviço Especial de Saúde Pública).
Desde aquela época, aos jovens e adultos o Estado oferece uma assistência limitada, baseada em extrações e algumas restaurações. Cultura que não mudou após a criação do SUS (Sistema Único de Saúde), em 1988.
Só 4,31% dos procedimentos odontológicos realizados para o conjunto da população são de alta complexidade (tratamento de canal, periodontia, por exemplo). No primeiro semestre de 2002, isso correspondeu a 3,3 milhões de procedimentos.
Quase 30 milhões de brasileiros jamais tinham visto a cara do dentista em 1998, dado do IBGE. Isso apesar de o país ter o maior número absoluto de dentistas do mundo (187,2 mil) e uma das melhores relações dentistas/por grupo de habitantes -superior ao recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e de países como os EUA, Canadá, Austrália, França, Inglaterra e Japão.
"A saúde bucal só ganhou status normativo com a Noas (Norma Operacional de Assistência) de 2001, quando define-se que é parte integrante e individual da assistência básica", afirma Carlos Henrique Goretti Zanetti, coordenador do curso de especialização em Saúde Coletiva da UnB.
Para ele, a falta de priorização do setor também pode ser explicada por escolhas da odontologia brasileira, que optou por ser uma corporação autônoma, e não uma especialidade da medicina como em países da Europa. "A corporação médica soube ocupar postos do poder." Ele aponta ainda que a alta rentabilidade dos consultórios afastou profissionais de hospitais, do serviço público, isolando-os na atividade autônoma.
Em um de seus trabalhos, o ex-coordenador de saúde bucal de São Paulo e Santos Marco Manfredini aponta que o próprio modelo da assistência, ao tratar só crianças, não incorpora segmentos populacionais com maior capacidade de pressão.


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