São Paulo, domingo, 21 de maio de 2000


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Universidade faz acordo com credores e alonga pagamento de R$ 125 milhões em precatórios vencidos desde 97



USP atrasa dívidas para tocar dia-a-dia

DA REPORTAGEM LOCAL

A USP -maior universidade do país-, com orçamento previsto de R$ 1,024 bilhão para este ano, vai atrasar o pagamento de dívidas judiciais para poder manter em dia contas de água, luz, telefone, limpeza, vigilância, restaurantes universitários e bibliotecas.
Se pagasse, além dos salários, todos os precatórios vencidos desde 1997, a direção da universidade ficaria sem sobras para investimentos e para gastos com a manutenção das instalações e compras.
Junto com as aposentadorias, os precatórios e os gastos com hospitais fazem o tripé do buraco financeiro das universidades. USP, Unesp e Unicamp têm dívidas judiciais e mantêm hospitais e centros de referência de saúde, cujo atendimento cresce anualmente, mas os repasses do SUS não vêm acompanhando.
Segundo dados da reitoria da USP, no início do ano, a universidade previa R$ 804 milhões para salários e R$ 118 milhões para custeio e investimento. Haveria uma margem manobrável de R$ 102 milhões (reserva de ajuste). Isso já seria insuficiente para pagar os R$ 125 milhões em precatórios vencidos desde 1997.
Com o reajuste de 7% e mais o abono de 18% de abril para professores e funcionários, a universidade entrou na reserva de ajuste e reduziu ainda mais o dinheiro para saldar as dívidas.
Resultado? "Tivemos que negociar com os credores dos precatórios trabalhistas, que são professores e funcionários que ganharam ações na Justiça", disse o reitor Jacques Marcovitch.
"Essas dívidas foram contraídas ainda pelo Estado. Mas, na época da autonomia, herdamos também esses passivos", afirmou.
A autonomia financeira e administrativa foi garantida às universidades de todo o país na Constituição de 1988. A autonomia das universidades paulistas foi regulamentada em lei no ano seguinte.
Foram definidos percentuais de repasses de verbas do Estado, e a administração, assim como as definições e decisões pedagógicas, ficaram a cargo das universidades. Por isso que, hoje, nas discussões salariais, os grevistas negociam com o conselho de reitores, presidido pelo reitor da USP.
Mas a autonomia transferiu também as dívidas com professores e funcionários que foram à Justiça pedindo incorporações salariais pelo trabalho noturno e recuperação de perdas do planos econômicos do passado -Cruzado 1 e 2, Bresser, Verão...
Essa bola de neve chegou aos R$ 125 milhões. Detalhe: a dívida está toda vencida. Teoricamente, a USP teria de pagá-la agora sob pena de intervenção estadual.
Houve uma negociação. A universidade e os credores chegaram a um acordo e alongaram o perfil desses pagamentos.
"Primeiro passo foi conseguir inverter a ordem dos pagamentos. Assim vamos pagar primeiros os precatórios de menor valor para depois saldar as dívidas maiores", explicou o reitor.
Uma parcela de R$ 6 milhões foi paga neste semestre e outros R$ 16 milhões serão saldados até dezembro. O "papagaio" foi empurrado para o próximo ano.

"Dá para pagar"
A associação dos docentes contesta os cálculos da reitoria, porque são feitos a partir do orçamento previsto para a universidade, mas os repasses vêm do valor real arrecadado pelo ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
"O orçamento previsto é uma peça de ficção. Com os cálculos sobre o orçamento repassado, é possível cobrir os gastos e garantir o reajuste aos servidores", diz Marcos Magalhães, presidente da Adusp.
O valor previsto de arrecadação total de ICMS no Estado para os quatro primeiros meses era de R$ 6,311 bilhões. Mas até agora os desempenho vem superando a previsão e a arrecadação chegou, segundo dados da USP, a R$ 6,512 bilhões.
Abril foi o melhor mês, com previsão de R$ 1,5 bilhão e arrecadação de R$ 1,7 bilhão.
"E todo mundo aponta para o crescimento da economia. Até o governo fala em 3%. Essa arrecadação, portanto, tende a se manter nesse patamar e até aumentar", disse Francisco Miraglia, vice na Adusp.
Além disso, o Fórum das Seis -que reúne os sindicatos de funcionários e professores das três universidades- fez uma projeção com base na média dos orçamentos realizados nos quatro últimos anos. Segundo o cálculo pessimista que projeta inflação de 6% e crescimento da economia em 1%, ainda assim seria possível bancar o reajuste de 25% pleiteado pelos servidores.
"Isso é uma temeridade. Amanhã ou depois, uma recessão ou uma crise internacional derruba nossa economia, como já aconteceu recentemente, e como iremos pagar os salários? Não podemos assumir compromissos que não temos certeza de que podemos cumprir", disse o reitor da USP.
O vice da Adusp rebate também esse argumento. "Se eles acham que é uma temeridade o comportamento futuro da economia, como anunciaram na última negociação um aumento de 3,75% para janeiro?"
"Uma recessão ou crise que derrube nossa economia vai quebrar o orçamento com 11% (7% já dados mais 3,75% em janeiro) ou com 25%", completou o dirigente da Adusp. (ESTANISLAU MARIA)



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