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TERAPIA MUNICIPAL
Megapsicodrama promovido pela prefeitura para discutir a questão da ética reuniu 700 profissionais em 160 locais
Divã de Marta vira balcão de reclamações
DA REPORTAGEM LOCAL
O megapsicodrama promovido
pela administração petista em São
Paulo transformou-se numa multiplicidade de palanques de queixas sobre a cidade e as condições
de vida. Pode entrar para o "livro
dos recordes" como a maior lamentação coletiva: em pelo menos 160 pontos da cidade, animados por cerca de 700 psicodramatistas, as pessoas se juntaram para
falar de sua relação com a cidade.
Na maioria dos locais, fizeram
mais queixas do que falaram de
seus sentimentos, como se espera
num psicodrama. Mesmo sem
números oficiais, a coordenação
do Projeto Ética e Cidadania estima que mais de 8.000 pessoas estiveram em algum momento participando das sessões.
Ontem à tarde, a equipe de psicodramatistas que encabeçou a
idéia "comemorava a vitória".
"O próximo vai tratar da violência contra a mulher", disse a prefeita Marta Suplicy, autora da
idéia. "A lei proíbe que se bata nas
mulheres, mas elas continuam
apanhando. Vamos entender
porque isso acontece."
Em muitos locais, as pessoas foram pegas de surpresa pela presença dos psicodramatistas.
Na praça da República (centro),
os técnicos, liderados pelo psiquiatra Aníbal Mezher, tentavam
convencer as pessoas a participar,
dando sua opinião sobre a cidade.
Quando ficaram mais à vontade
com a situação, algumas das cerca
de 60 participantes começaram a
formar fila para falar ao microfone. Problemas como sujeira da cidade, ausência de um projeto
educativo na Febem (Fundação
Estadual do Bem-Estar do Menor) e desemprego foram os principais alvos das reclamações.
Segundo Mezher, a atividade foi
o maior evento na história do psicodrama. "Estamos tendo uma
experiência educativa, tentando
mostrar ao cidadão que ética não
é bobagem", afirmou.
Na praça da Sé (centro), que
reuniu o maior número de participantes, cerca de 120 pessoas se
aglomeravam em volta do palco
improvisado animado pelo psicodramatista Ronaldo Pamplona.
Problemas como desemprego,
falta de moradia, alimentação e
dificuldades em receber a aposentadoria foram os temas mais
abordados pela população.
Alguns grupos de jovens acabaram entrando em discussão com
evangélicos e moradores de rua.
Na praça Floriano Peixoto, em
Santo Amaro (zona sul), as queixas se concentraram no emprego,
transporte, violência, educação e
limpeza urbana. Durante as representações, poucos transeuntes
pararam para assistir. A platéia
contava com 30 espectadores.
Cerca de 20 pessoas participaram das encenações, a maioria
simpatizantes do PT e alunos de
uma escola municipal.
Na representação a respeito de
transporte, a crítica foi contra as
lotações. No fim, os convidados
sugeriam soluções para o problema encenado. "Vamos imitar o
Japão, andando de bicicleta. Vamos comprar um jegue, fazer alguma coisa", disse a dona-de-casa
Eva Cabral da Silva, 42.
"É uma tribuna do povo, não
é?", questionou a agente escolar
desempregada Maria Helena
Paula, 49. Maria participou da encenação sobre desemprego e sugeriu o cooperativismo como solução. "Gente, a Páscoa está aí, vamos fazer ovos e dividir os lucros", afirmou.
A dramatização sobre educação
fez críticas ao programa do governo do Estado de progressão continuada. No fim da sessão, os psicodramatistas distribuíram a letra
da música "O que É? O que É?", de
Gonzaguinha, para que todos
cantassem enquanto acenavam
com bexigas coloridas, também
cedidas pela equipe municipal.
Na Sociedade Assistencial do
Capão Redondo (zona sul), os
psicodramatistas não aparecem e
deixaram cerca de cem pessoas
esperando. O presidente da entidade, José Grigório de Jesus,, disse que a revolta foi geral. "Arrumamos mesa, microfone, deixamos tudo arrumadinho, e nada.
Todo mundo aqui do Capão já se
sente abandonado, aí vem uma
dessas."
(MELISSA DINIZ, SÉRGIO DURAN E AURELIANO BIANCARELLI)
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