São Paulo, quinta-feira, 22 de abril de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

RIO

Traficantes da Mangueira, do Dendê e do Jacarezinho, por exemplo, oferecem produto de melhor qualidade, segundo a polícia

Cliente deixa Rocinha por droga mais pura

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Com a favela da Rocinha (São Conrado, zona sul do Rio) ocupada por 1.300 policiais desde a semana passada, os usuários que subiam o morro para comprar drogas decidiram migrar para outras comunidades para adquirir cocaína e maconha.
Segundo levantamento da Cinpol (Coordenadoria de Inteligência da Polícia Civil), pelo menos cinco favelas da capital estão recebendo os "antigos clientes" da Rocinha. Os usuários estão migrando para as favelas do Jacarezinho, da Mangueira, do complexo do Dendê (todas na zona norte), do complexo de São Carlos (zona central) e do Rebu (oeste).
De acordo com a Cinpol, a escolha dos dependentes químicos por essas comunidades não está ligada à ausência de tiroteios ou da presença policial. O principal fator que leva os usuários a escolher essas comunidades é a "qualidade" da droga que é oferecida.
A própria polícia admite que não tem como reprimir, de imediato, essa migração dos usuários. Isto porque toda a Polícia Civil está mobilizada na captura do traficante Eduíno Eustáquio de Araújo Filho, o Dudu, responsável pela tentativa de invasão à Rocinha, ocorrida no dia 9.
Apesar de estar ocupada, a Rocinha continua sendo considerada o principal entreposto de drogas no Rio. Embora os viciados não estejam subindo o morro, a favela se sustenta com o consumo dos próprios moradores e com os chamados "usuários eventuais", que recebem a droga em casa.

Um por três
Segundo o serviço de Inteligência da Polícia Civil, para atrair os usuários, os traficantes destas favelas procuram não misturar tanto a cocaína a outras substâncias para dar um certo "grau de pureza" à droga, assim como já é feito na Rocinha.
Nas favelas que estão recebendo "antigos clientes" da Rocinha, informa a Cinpol, 1 kg de cocaína pura é transformada em 3 kg ao ser misturada com fermento em pó. Segundo os investigadores da Polícia Civil, esse é o maior grau de pureza da cocaína que é comercializada nas favelas do Rio.
Os traficantes misturam a cocaína a outras substâncias para aumentar seu lucro final. Um quilo da droga hoje custa cerca de R$ 6.000 no mercado internacional. A cocaína vendida em favelas do Rio é produzida em países como Colômbia e Bolívia.
Segundo a Cinpol, há favelas completamente "falidas" hoje no Rio em termos de tráfico, como é o caso do morro do Borel (Tijuca, zona norte), por serem mal administradas pelos chefões do tráfico. Nessas comunidades, os traficantes chegam a transformar 1 kg de cocaína em até 9 kg, o que não atrai os usuários.
Metade do que as bocas-de-fumo arrecadam com a venda de drogas fica com o "dono da favela", esteja ele em liberdade ou preso. O dinheiro normalmente é lavado na aquisição de bens. Os chefões do tráfico gostam de ostentar riqueza e compram carros importados, apartamentos luxuosos, mansões, além de abrirem empresas.
Outros 35% do faturamento são gastos na aquisição de armamento pesado (como fuzis e granadas) e munição para enfrentar quadrilhas inimigas e a polícia. Os 15% restantes são para pagar salários dos "soldados" e "gerentes", além das despesas de cúmplices presos.

Em vão
A Polícia Civil do Rio desmobilizou ontem o efetivo de quase 500 policiais que, desde sexta-feira, ocupavam o complexo de favelas do Alemão (zona norte) para tentar capturar o traficante Eduíno Eustáquio de Araújo Filho, o Dudu, líder da tentativa de invasão à favela da Rocinha.
O fim da ocupação ocorreu porque a polícia recebeu informações de que Dudu poderia estar escondido em outras favelas dominadas pela facção criminosa CV (Comando Vermelho) e não faria sentido continuar com um grande efetivo no local.


Texto Anterior: Rio: Polícia investiga suposta conexão angolana
Próximo Texto: Tiroteio passa próximo de ato pela paz em favela
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.