São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 2000


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OUTRO LADO
Para o prefeito do Rio de Janeiro, combate ao crime organizado depende de outras iniciativas públicas

"Programa não elimina tráfico", diz Conde

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Moradora passa por rua asfaltada em Fernão Cardim, onde as obras do Favela Bairro terminaram


ANTONIO CARLOS DE FARIA
DA SUCURSAL DO RIO

O prefeito do Rio, Luiz Paulo Conde (PFL), 65, diz que o Favela Bairro não acabou com a ação de traficantes, pois isso depende de mais iniciativas, como um maior investimento no policiamento urbano e das fronteiras.
Mesmo assim, ele acredita que o melhor resultado possível não será o fim desse tipo de crime, mas colocá-lo na clandestinidade, acabando com o poder dos traficantes sobre as favelas.
Conde justifica o slogan "Favela Bairro - o maior projeto social do mundo", usado em outdoors da prefeitura, dizendo que não conhece lugar com investimento semelhante. A seguir, os principais trechos de sua entrevista.

Folha - Por que a prefeitura diz que o Favela Bairro é o maior projeto social do mundo?
Luiz Paulo Conde -
É o maior porque acredito que em lugar nenhum do mundo esteja se investindo R$ 1,2 bilhão em um programa dessa natureza. Temos, além de recursos próprios, financiamentos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), da CEF (Caixa Econômica Federal) e da União Européia, o que está permitindo a extensão do projeto. Desde 1963, participo de seminários no Brasil sobre reforma urbana e foram feitas várias experiências para resolver os problemas de comunidades carentes. O Favela Bairro é uma evolução das idéias anteriores. É a constatação de que há favelas que fazem parte da história da cultura carioca.

Folha - Quais as principais qualidades do projeto?
Conde -
Respeitar as relações culturais existentes nas favelas e reconhecer que existe em qualquer favela um grande investimento feito pelos seus próprios moradores. No Favela Bairro abrimos ruas, criamos praças, criamos limites para as favelas, empregando operários que moram na própria comunidade. Além disso, o projeto valoriza as casas dos favelados, o que os incentiva a melhorar suas moradias. Essas iniciativas estão valorizando também a auto-estima dos favelados, eles estão sentindo orgulho de onde moram.

Folha - Há um pensamento estabelecido de que o tráfico prospera nos locais onde o Estado não se faz presente. O Favela Bairro é uma resposta para isso?
Conde -
O Favela Bairro diminuiu a violência onde foi implantado. Conheço bem os Estados Unidos, Paris, onde há áreas em que não se entra. Quando uma favela deixa de ser um labirinto, a tendência é diminuir o tráfico. Agora, as disputas de quadrilhas por pontos-de-venda de drogas existem em todo mundo. No Rio, devido à proximidade das favelas, a entrada do tráfico criou muitos problemas. Nosso problema não é acabar com a criminalidade, o que não se conseguiu em lugar nenhum do mundo, mas colocar o crime na clandestinidade. O Favela Bairro é um instrumento sério, forte e decisivo para isso.

Folha - Das 27 favelas onde o Favela Bairro terminou, 20 ainda continuam com tráfico. Por que a situação não mudou?
Conde -
O tráfico existe em todos os lugares. A solução para isso só virá com um conjunto de iniciativas. Favela Bairro, educação, saúde, crescimento econômico e investimento em policiamento vão fazer a situação melhorar. Os governos federais nunca deram importância para essa questão, as rotas do tráfico são internacionais e federais. Agora é que estão reestruturando a Polícia Federal. Tem de ter investimento no policiamento urbano. Se não houver, as cidades serão invadidas e dominadas pelo tráfico, como aconteceu na Colômbia e nos EUA.

Folha - O Favela Bairro criou só nove cooperativas, dentro do programa de geração de renda. Isso não é pouco?
Conde -
Nós criamos uma Secretaria Municipal do Trabalho, o que não existia. As leis ainda inibem o funcionamento de cooperativas. Eu prefiro formar bem menos cooperativas do que formar muitas e mal. Há essa mania de fazer muitas coisas de forma malfeita, só para dizer que se fez. O problema social não será resolvido de uma hora para outra e a cooperativa é um dos incentivos do Favela Bairro, mas não é o único. Há os garis comunitários, as creches, todos criando empregos.

Folha - Como o senhor responde às críticas sobre a qualidade das obras? Há reclamações de que até piorou a situação de moradores em algumas comunidades. O Crea (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) diz que a prefeitura não fiscaliza a qualidade das obras.
Conde -
No espaço de dez anos, caso eu seja reeleito, o Favela Bairro vai colocar 90% da população favelada do Rio em situação resolvida. Quanto à qualidade de obra, há obras bem-feitas e malfeitas. Mas a cada dia estamos melhorando, porque estamos aprendendo a fazê-las nas favelas. Agora, estamos em um ano eleitoral, quando se aproveita para fazer reivindicações. Em Três Pontes, os prejudicados estão numa comunidade ao lado da área beneficiada. No Borel, transferimos todos os moradores de área de risco que concordaram em sair, mas não podemos fazer isso se não quiserem. O Crea devia se preocupar com o exercício da profissão de arquiteto e engenheiro, com a qualidade das escolas. Essas frases de efeito não me emocionam.


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