São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 2002

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RELIGIÃO

Idealizadores atribuem à intervenção divina a facilidade que encontraram para unir as trilhas do caminho brasileiro

Roteiro já começa cercado de misticismo

DO ENVIADO ESPECIAL

Assim como costuma ocorrer no Caminho de Santiago de Compostela, sua versão brasileira já começa envolta em misticismo.
Muitos dos peregrinos que percorrem a pé o trajeto entre a França e a Espanha voltam aos seus países de origem contando sobre algum fenômeno que presenciaram ou viveram. Com os primeiros grupos a percorrer trechos do Caminho da Fé ocorreu o mesmo.
""Os milagres começaram já na fase inicial, na materialização do projeto. Depois de traçarmos o caminho pelo mapa, achávamos que enfrentaríamos dificuldades nas paróquias e nas prefeituras. Mas não. Como se Nossa Senhora estivesse nos iluminando, em todos os lugares que fomos as trilhas já estavam prontas. Só faltava alguém para uni-las", afirma Aparecida de Lourdes Dezena Cabrelon, presidente da Scorp (Sociedade Comunitária Renovação e Progresso), uma ONG de Águas da Prata que aderiu ao projeto.
Ela conta que, num único dia, chegou a percorrer com Almiro Grings -idealizador da rota- sete prefeituras sem agendar nenhuma das audiências.
""Fomos na ponta dos pés, com medo de os prefeitos rejeitarem, mas, além de sermos atendidos por todos prontamente, éramos recebidos com tapete vermelho. Não foi difícil encontrar nenhum prefeito. Senti que tinha alguma coisa a mais, vinda lá de cima. Os prefeitos forneciam a rota das trilhas na mesma hora. A sensação era de que já estava tudo traçado."
Segundo Grings, o caminho foi se desenhando sozinho, entre trilhas de romaria já existentes e outras de trekking. ""O que traçamos a olho, no mapa já existia. Todos os proprietários de fazendas do trajeto concordaram em abrir suas cercas sem problema."
Grings conta que, ao chegar a Consolação (MG), uma cidade com 1.699 habitantes -menos povoada que o menor dos municípios paulistas, que é Águas de São Pedro, com 1.883 habitantes-, ele e Cabrelon foram chamados de anjos pelos representantes da administração local.
""Disseram que tínhamos caído do céu, pois a cidade não encontrava uma forma de se desenvolver, apesar de sua riqueza natural", conta o fiscal aposentado.
Outra revelação veio de um peregrino que acompanhou o grupo de estréia do percurso em Águas da Prata. Depois de ficar sabendo durante a madrugada que poucas horas depois haveria uma caminhada, ele decidiu participar. E ficou empolgado com o projeto, inicialmente traçado apenas entre Águas da Prata e Aparecida.
Na noite seguinte, veio a ""revelação". O peregrino teve a visão de um padre se encontrando com Nossa Senhora Aparecida. Chegou à conclusão, depois, que se tratava do padre Donizetti Tavares de Lima, indicando o início do caminho em Tambaú, outro tradicional centro de romaria do interior paulista.
""Após esse fato, aprovamos a extensão do caminho até Tambaú numa segunda etapa. Será a consolidação do eixo religioso. O projeto prevê a possibilidade de outras ampliações do caminho futuramente", afirma Grings.
A oficialização do segundo trecho deve ocorrer em 16 de junho, dia da festa anual em homenagem ao padre Donizetti, que morreu nessa data em 1961.

Outros projetos
Outros dois projetos de trilhas de peregrinação apoiados pela igreja, mas que não tiveram tanto sucesso por falta de um apelo mais forte como o do ""eixo religioso" ligando Tambaú a Aparecida, podem se tornar ramificações do Caminho da Fé, como ocorre na Espanha, onde há três rotas opcionais que levam a Santiago de Compostela.
""Teremos esse eixo como o principal, mas nada impede que surjam novas ramificações e que outros caminhos também venham ao encontro do nosso, desembocando nos dois centros de romaria", afirma o aposentado Clóvis Tavares de Lima, 55, que integra a comissão organizadora do Caminho da Fé.
Um dos projetos refaz o itinerário de 105 km que era percorrido pelo padre Anchieta no Espírito Santo, entre a ilha de Vitória e a cidade de Reritiba (atual Anchieta).
Esporadicamente são formados grupos, geralmente por ocasião do feriado de Corpus Christi, para percorrer o trajeto a pé, a cavalo, de bicicleta ou até de caiaque.
A outra ramificação seria a trilha que vai de Santana do Parnaíba a Águas de São Pedro, batizada de Caminho do Sol, com 209 km. (MAÉRCIO SANTAMARINA)


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