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URBANIDADE
Cemitério Cor
Formada em artes plásticas pela Faap, Fernanda Saguas conseguiu estabelecer uma
ligação estética entre a Casa Cor,
onde se exibe o que há de mais
sofisticado em decoração, e jovens presos transformados em
arte. Nesta semana, a experiência acabou num cemitério.
Em 1999, Fernanda enfiou-se
na Febem do Tatuapé e trabalhou com alguns de seus internos
o tema "biografia". O tema a levou a discutir sobre a falta de
identidade de quem não se sente
respeitado -uma das razões
para mais uma rebelião ocorrida, ontem, naquela unidade da
Febem, com saldo de 55 feridos.
Não apenas cada um teria de refletir sobre sua própria vida mas
encaixá-la numa linha do tempo. "Estávamos influenciados
pela virada do milênio, e isso estimulava a discussão sobre a história." Para aprofundar as reflexões e a sensação de que poderiam desenvolver uma identidade, eles fizeram máscaras de cerâmica moldadas nos rostos.
"Queríamos que eles saíssem da
invisibilidade. Afinal, os rostos
deles não poderiam aparecer nos
jornais, exceto com tarjas", conta Fernanda.
O que impressionou Fernanda
Saguas foi a animação dos adolescentes esculpindo as máscaras
em seus colegas, cujas faces estavam cobertas de massa. Viu ali
um prazer do toque sutil, inédito
para todos. "A arte tem esse poder mágico."
Trabalho terminado, foi feito
um muro, em 2000, na Casa Cor,
com todos aqueles rostos anônimos enfileirados, como se testemunhassem, silenciosamente, o
desfile das celebridades e das
roupas de grife. Acabou a exposição, a obra foi devolvida e ficou
guardada num porão, tão anônima quanto seus inspiradores.
"Parecia mesmo um destino
previsível."
Na semana passada, as máscaras, como muitos dos internos da
Febem, acabaram no cemitério,
com a diferença que, dessa vez,
para comemorar a vida. Está
sendo realizada uma experiência que reúne artistas plásticos,
entre os quais o renomado José
Roberto Aguilar, para fazer do
cemitério São Paulo, em Pinheiros, uma espécie de ateliê a céu
aberto; os espaços são ocupados
por peças de cerâmicas, algumas
delas elaboradas por pichadores,
que buscam estilizar suas letras.
Duas esquinas da avenida
Henrique Schaumann receberam as máscaras dos adolescentes da Febem, resgatando do anonimato a obra de Fernanda
e, junto, o anonimato dos modelos. "Pelo menos ali ficarão visíveis para sempre."
E-mail - gdimen@uol.com.br
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