São Paulo, quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

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GILBERTO DIMENSTEIN

Vingança contra o Minhocão


O arquiteto que viu o elevado surgir e hoje prepara um projeto de revitalização da região central de São Paulo

MARCOS CARTUM , 46, teve seu primeiro grande choque estético quando estava com nove anos: o Minhocão rasgou a paisagem do apartamento em que morava. "Suspeito que, ali, comecei a tomar a decisão de virar arquiteto." Nesta semana, a criança está por trás da prancheta do arquiteto num plano contra a deterioração do centro, do qual aquele viaduto é seu principal símbolo.
A partir de um projeto em que Marcos Cartum foi um dos desenhistas, uma equipe de técnicos de diversas secretarias da prefeitura está planejando um choque de civilidade no centro -e tudo começou com um anexo do Teatro Municipal.

 

Para Marcos, São Paulo era quase exclusivamente o centro. Além do apartamento, sua escola ficava na praça da República (Caetano de Campos) e seu pai tinha uma loja nas redondezas. "Desde muito pequeno, me divertia andando pelas ruas, entrando nas lojas, nos cinemas, nas livrarias."
A deterioração daquele espaço já fazia parte de seus ressentimentos quando entrou na Faculdade de Arquitetura da USP. Formado, abriu seu escritório de projetos. Em 2005, foi chamado pelo secretário municipal da Cultura, Carlos Augusto Calil, a pensar com outros arquitetos um anexo do Teatro Municipal para ensaios, ocupando prédios abandonados ou degradados do entorno; muitos cinemas dedicavam-se apenas a filmes pornôs ou estavam fechados.
Surgia o projeto Praça das Artes, de frente ao vale do Anhangabaú.
Acontece que, com apoio de Calil, o projeto foi crescendo -mas apenas na imaginação e no papel.

 

Imaginou-se um choque de arte com a recuperação dos cinemas para os mais diversos tipos de shows, a reurbanização do vale do Anhangabaú, a criação de uma escola de circo, a transformação de prédios abandonados em incubadoras de economia criativa, a abertura de novos centros culturais -tudo isso se comunicando por calçadões.
Nem mesmo o Praça das Artes conseguia sair rapidamente do papel, mais difícil ainda todas aquelas intervenções. "É um plano que exige muitas parcerias, inclusive com o governo federal", afirma Calil. Um dos projetos é abrir um espaço cultural no prédio dos Correios.

 

Há sete dias, Gilberto Kassab disse que aquele projeto não era mais de uma secretaria só, mas da prefeitura, e determinou a criação de um grupo técnico para criar uma das vitrines de sua gestão -o primeiro encontro ocorreria nesta semana.
Quando e se todo o projeto vai sair do papel, não dá para saber. No entanto o fato é que a criança atacada pelo Minhocão sente pelo menos a ilusão de vingança.

 

PS - O projeto é da altura da São Paulo do futuro. Coloquei os desenhos e vídeos no catracalivre.com.br. No mínimo, podemos compartilhar o gosto ou a ilusão de uma cidade civilizada.

gdimen@uol.com.br


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