São Paulo, quinta-feira, 24 de novembro de 2005

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JUSTIÇA

Processo administrativo vai avaliar conduta de magistrado, que alega que a superlotação nas carceragens cria condições desumanas

Tribunal afasta juiz que soltou condenados

PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

A Corte Superior do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por unanimidade, afastou ontem das suas funções o juiz Livingsthon José Machado, da Vara de Execuções Criminais de Contagem (MG). A Corte também abriu processo administrativo que avaliará a conduta dele.
Anteontem, pela terceira vez, o magistrado determinou a soltura de presos condenados, mesmo após decisão liminar do TJ, da semana passada, que o proibia de promover novas libertações.
O juiz alega que a superlotação nas carceragens das delegacias de Contagem criam condições desumanas e insalubres para os presos. Ele quer que os condenados sejam transferidos para penitenciárias, mas faltam vagas.
A Corte, formada pelos 25 desembargadores mais antigos do TJ-MG (são 117 no total), tomou a decisão baseada na representação contra o juiz apresentada pelo corregedor-geral de Justiça, desembargador Roney Oliveira. Desde a semana passada, a Corregedoria já havia instaurado procedimento interno para avaliar os atos de Machado.
Procurado pela Folha, a informação no gabinete do juiz é que ele não iria se pronunciar.
Segundo o TJ, o afastamento é imediato. Significa que Machado fica sem nenhuma atribuição. Um outro juiz da Vara de Execuções Criminais de Contagem já foi nomeado para exercer as funções do juiz investigado.
No processo administrativo, será indicado um relator, que, após dar amplo direito de resposta a Machado, remeterá o relatório para julgamento pela Corte. Não há prazo determinado.
O juiz está sujeito às seguintes punições: aposentadoria compulsória, remoção para outra comarca, disponibilidade compulsória até aparecer vaga em outra comarca e demissão.
Uma comissão da Procuradoria Geral de Justiça, a quem compete oferecer denúncia contra magistrados, também avalia os atos de Machado.
Por três vezes, Machado determinou a soltura de presos. Há duas semanas, ele expediu alvará de soltura para 16 detentos.
Condenados por crimes como homicídio, furto e assalto à mão armada, todos saíram pela porta da frente da delegacia.
O governo de Minas recorreu ao TJ e obteve liminar dois dias depois, quando os presos já estavam nas ruas. Novos mandados de prisão foram expedidos, mas apenas 4 dos 16 voltaram para a prisão.
Na semana passada, foram mais 36 alvarás expedidos. Só que a Polícia Civil retardou o cumprimento, mantendo os presos na delegacia até que o Tribunal de Justiça concedesse nova liminar, que proibisse novas solturas.
No entendimento do TJ, do Ministério Público e da seção mineira da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o direito dos presos é reconhecido, mas a libertação deles fere o direito coletivo da população de não conviver com presos condenados.
Anteontem, ele solicitou a presença no fórum de sete condenados por assalto e tráfico de drogas. Escoltados pela Polícia Militar, os presos se apresentaram e receberam a notícia da libertação. Agindo assim, evitou eventual retardamento das medidas por parte da Polícia Civil.
"Até os presos ficaram surpresos", disse o sargento Antônio Carlos Ávila, um dos PMs que faziam a escolta.
Até as 18h ainda não havia no TJ decisão sobre o novo pedido de liminar feito pelo Estado para prender novamente os sete condenados libertados.

Mais vagas
Na semana passada, a Secretaria de Defesa Social de Minas afirmou ter ampliado o sistema penitenciário neste ano, o que fez cair para 4.700 o déficit de vagas para presos que cumprem pena em unidades da Polícia Civil.
A pasta disse ainda que abrirá 3.540 vagas até março de 2006. Até lá, segundo a secretaria, cinco novas penitenciárias estarão em funcionamento e centros provisórios serão ampliados.
Questionada sobre esse número, a secretaria não soube precisar se 4.700 é a quantidade exata de condenados em delegacias.
O motivo é que houve transferências de detentos entre unidades da secretaria e da Polícia Civil. Além disso, muitos presos que já foram condenados permanecem em delegacias porque estão aguardando para serem julgados em outros processos.

Reforço policial
Na manhã de ontem, em Contagem, o clima instalado era de uma grande perseguição policial. Mas era apenas uma medida de prevenção determinada pelo comando da Polícia Militar, que deslocou cerca de 150 homens para o município. Eles se somaram aos cerca de 90 PMs que fazem o policiamento rotineiro na cidade.
Por volta das 9h30, os policiais foram às ruas, e alguns veículos saíram do 18º Batalhão com sirenes ligadas. Na porta do Fórum de Contagem, onde o juiz trabalha, PMs e cães faziam a guarda do prédio. A justificativa era coibir eventuais protestos contra a decisão de Machado.


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