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SÃO PAULO 454 ANOS / IMIGRAÇÃO
Chineses dividem com os japoneses o bairro da Liberdade
Originalmente ocupado por portugueses e italianos, e tradicional reduto japonês, região concentra hoje chineses
Lojistas do bairro -embora sejam chineses e vendam
produtos da China- mantiveram a identidade
japonesa nas fachadas
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
Os ideogramas na fachada do
prédio de número 460 da rua
São Joaquim enganam. Quase
ao lado da Sociedade Brasileira
de Cultura Japonesa, o local,
batizado de Hakka (um grupo
étnico do sul da China), abriga o
Escritório Cultural e Econômico de Taipei e o centro de meditação chinesa Fo Guang Shan.
Aos cem anos da imigração japonesa, a Liberdade já não é
mais a mesma.
O bairro da região central de
São Paulo -originalmente ocupado por portugueses e italianos, e tradicional reduto japonês- está cada vez mais ocupada por chineses, que falam pouco ou quase de português.
A explicação é histórica, dizem o pesquisador japonês
Koichi Mori, da USP, e o diretor-presidente da Acal (Associação Cultural e Assistencial
da Liberdade), Hirofumi Ikesaki. Como os japoneses prosperaram -educando os filhos,
que seguiram carreiras como
direito e medicina-, não houve
herdeiros para o comércio.
"Os chineses começaram a se
estabelecer no bairro e adquiriram essas lojas", diz Mori. "Hoje, os comerciantes não são
apenas japoneses", diz Ikesaki.
Num passeio pela rua Galvão
Bueno, a principal do bairro,
nota-se a presença maciça chinesa em restaurantes e no comércio de artigos importados.
Curiosamente, alguns lojistas -embora sejam chineses e
vendam produtos da China-
mantêm a identidade japonesa
nas fachadas.
É assim na Lucky Cat (com
dono e mercadorias chineses e
letreiro em japonês); no restaurante Itiriki (proprietário taiwanês, nome japonês e cardápio coreano, chinês e japonês),
ambos na praça da Liberdade; e
no supermercado Marukai (dono chinês, nome japonês e produtos de origem asiática).
"Chinês quer se disfarçar de
japonês para vender para todo
mundo. É a globalização", afirma o médico taiwanês Hsu
Chih Chin, no Brasil desde
1973, formado pela USP e tradutor da reportagem na incursão pela Liberdade chinesa.
O reflexo de que os imigrantes chineses vieram para ficar
se vê pelo bairro. Na rua da Glória, a escola Yu Çaí Xue Yuan é
especializada na educação infantil de filhos dos imigrantes
nascidos no Brasil.
Outra evidência da nova caracterização do bairro é a comemoração do Ano Novo chinês na praça da Liberdade, que
amanhã acontece pela terceira
vez na cidade (antecipado por
conta do Carnaval).
Chefe de cozinha do restaurante Rong He, o chinês Yang
Xiao Wei, 38, imigrou há três
anos "porque gosta de futebol".
Tem uma filha de um ano e
meio, nascida no Brasil.
"Tem muita harmonia na
convivência com os japoneses",
diz Yang, em mandarim (o doutor Hsu traduz).
Presidente da Associação de
Ensino de Arquitetura e Urbanismo de São Paulo, Anália
Amorim, que projetou o templo budista da São Joaquim, explica a origem da Liberdade.
"A sociedade demandava que
a cidade respondesse com essa
caracterização, senão seria
uma mãe muito madrasta."
Embora já estejam espalhados por todo o bairro, os comerciantes chineses se concentram
na rua Barão de Iguape. É curioso ver restaurantes e lojas japonesas e chinesas lado a lado.
Na Conselheiro Furtado estão
as quitandas, com produtos
frescos e peixes vivos e lojas de
medicina chinesa.
E o doutor Hsu ensina a identificá-los: "As cores chinesas
são verde e vermelho, bem fortes, características do comportamento do povo".
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