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MÉDICO-PADRÃO
Casal faz jornada dupla
e leva trabalho para casa
da Reportagem Local
O casal de médicos Grace e Jamal
Suleiman enfrenta uma rotina comum à maioria dos médicos brasileiros: dividir o trabalho em uma
instituição pública com um consultório particular. Das 8h às 17h,
eles trabalham no Hospital Emílio
Ribas e depois atendem o mesmo
tipo de pacientes -a maioria portadores do HIV- em sua clínica
no bairro de Cerqueira César, região central de São Paulo.
"O serviço público é uma ilusão. Se você faz 20 horas, o Estado
paga R$ 1.300 por mês. No nosso
caso, que damos 40 horas, recebemos o dobro. Mas é o atendimento
particular que ajuda a dar melhores condições de vida", comenta
Grace, 41, há 15 anos na profissão
-formou-se junto com o marido,
Jamal, 38, em Mogi das Cruzes.
Foi quando faziam a residência
que surgiram casos de Aids no
Brasil, transformando a visão que
teriam da infectologia, área que já
haviam escolhido para atuar.
"O doente de Aids é diferente. É
uma doença que mobiliza emocionalmente o sujeito de uma maneira muito intensa, o que muitas vezes faz o médico ficar exausto com
a demanda", diz Jamal.
"O paciente de câncer tem o
apoio da família. O de Aids muitas
vezes tem no médico seu único
apoio", completa Grace.
Jamal atende na enfermaria e
Grace, no ambulatório do Emílio
Ribas. Em casa, com a família
-têm duas filhas-, eles não conseguem evitar os assuntos de trabalho. "Essa coisa de "depois
que chego em casa esqueço do trabalho' não funciona com a gente.
Mas numa boa. A gente não evita
nem mesmo falar na frente das
crianças. Só um pouco, mas para
dar atenção aos assuntos delas,
não para esconder", revela Grace.
Apesar de achar que a medicina
no Brasil vai mal -"está um
terror", ela diz-, nenhum dos
dois se arrepende de ter optado
pela carreira. "Não conheço nenhuma profissão que dê uma satisfação pessoal tão grande. Você
não pode imaginar o prazer de ver
alguém melhorar. Se uma de minhas filhas decidisse ser médica,
ficaria orgulhoso", diz Jamal.
Grace, embora destaque o lado
humanitário da profissão, tem algumas dúvidas. "É muito desgastante, não sei se quero que uma
delas seja médica. É uma classe
muito desunida. Mas eu faria tudo
de novo."
CYNARA MENEZES
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