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SEXO, ALFACE E ROCK N'ROLL
Comércio começa a mirar straight edges, jovens que não bebem, não fumam e não comem carne
Rua Augusta vira ponto de encontro de "punk careta"
SIMONE HARNIK
DA REPORTAGEM LOCAL
Eles passariam despercebidos,
como quaisquer jovens freqüentadores dos cinemas e galerias da
rua Augusta, zona central de São
Paulo. Mas alguns detalhes no visual -como camisetas com dizeres "drug free" (livre de drogas),
"meat is murder" (carne é homicídio) ou tatuagens com a letra
X- caracterizam os straight edges, grupo punk que não bebe,
não fuma, não usa drogas, evita
derivados de animais e que adotou a região como referência.
Cada vez mais, adeptos da idéia
abrem seus empreendimentos na
área, que ganha uma cara nova.
Esse é o caso do tatuador e
straight edge Fernando Franceschi, o Teté, 31.
Com o estúdio montado na Augusta há um ano, o desafio agora é
manter um restaurante vegan
(que não utiliza nenhum produto
derivado de animais), o Vegacy,
em uma galeria nas proximidades. "O restaurante é parte da luta
pela causa. O nosso lema é uma
cozinha livre de crueldade. Ele está dando certo, não dá lucro, mas
dá pra pagar todas as contas."
O estilo de vida vegan e livre de
drogas, Teté escolheu há cerca de
nove anos. "Já tinha feito um
monte de coisa na vida. Meu pai
morreu bebendo. Depois que minha mãe chorou ao me ver bêbado, nunca mais bebi", relata. E a
escolha vem sendo sustentada
com orgulho, já que, pelo corpo,
várias tatuagens a mencionam.
Do atendimento do restaurante,
cuidam outros dois straight edges. André Vieland, 23, que também trabalha com efeitos especiais em uma produtora de vídeos, e Marianne de Oliveira Ramos, 22, estudante de letras e, ironicamente, "bartender" em uma
casa noturna. "Quanto mais perto
da bebida fico, mais tenho certeza
da minha escolha. Não quero beber mesmo!", brinca.
O restaurante é freqüentado por
quem trabalha perto da Augusta e
por amigos straight edges, como
Maila Carrenho da Silva, 22, estudante de ciências sociais e funcionária de uma das lojas da galeria.
"Quando me perguntaram se eu
queria trabalhar na loja, vi que era
na Augusta e aqui é onde quero ficar", diz. Ela mora no Tatuapé
(zona leste), mas passa boa parte
do tempo na região.
Para a pesquisadora do Núcleo
de Antropologia Urbana da USP
Bruna Mantese, que estudou o
grupo, a escolha da área não foi
planejada. Mas a proximidade de
atividades culturais e do centro da
cidade e a rede de transportes da
região são estímulos para os
punks adotarem a área.
"Na Augusta, tem uma coisa especial e que combina com o perfil
dos straight edges. Ela é uma rua
que abriga uma diversidade muito grande de grupos, desde a prostituição, até a parte mais cultural,
o comércio. Isso faz com que eles
se sintam à vontade", afirma.
O ponto de encontro principal
dos que adotaram politicamente
o estilo livre de vícios não poderia
ser mais coerente: uma sorveteria.
A Soroko, na parte central da Augusta, é anunciada pelos guias
gastronômicos como um dos
points que oferecem sorvete de
leite de soja, apropriado para
quem tem intolerância à lactose
(uma proteína do leite).
Mas tudo começou com a sugestão de uma straight edge que
freqüentava o local. "Ela pediu
para trocarmos o leite pelo leite de
soja, porque tinha saudades de sabores como morango e chocolate.
Daí, minha mulher foi aperfeiçoando a receita", conta Anatolie
Soroko, o proprietário.
Segundo ele, cerca de um terço
da produção é feita para o público
punk. Principalmente nos finais
de semana, o local fica cheio de
adeptos da idéia. "Eles passam o
dia todo aqui conversando. Aí
chegam uns, outros vão embora,
mas estão sempre aqui", diz.
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