São Paulo, sábado, 26 de maio de 2007

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WALTER CENEVIVA

Octavio

Posso dizer que nossa relação foi fraterna, construtiva e, sobretudo, marcada por sua lealdade exemplar

O TÍTULO DESTA coluna tem uma explicação: nos 40 anos em que convivi com Octavio Frias de Oliveira, desde o primeiro dia, sempre só o chamei de Octavio.
Trabalhar com ele correspondeu a alternativas e soluções próprias da advocacia e do jornalismo, trocando idéias com toda franqueza, ora aceitas, ora recusadas ou recompostas na busca da melhor resposta de cada problema. Transcenderam muitas vezes os temas de direito ao envolver os fatos da vida, matéria na qual recebi dele lições preciosas. Talvez por tudo isso a naturalidade do uso.
Aproximamo-nos mais quando Octavio e seu sócio Carlos Caldeira Filho assumiram, em 1968, a presidência e a vice-presidência da Fundação Cásper Líbero, então com muitas dificuldades econômico-financeiras. Octavio não desistia da crítica enquanto insatisfeito com a resposta para qualquer solução, mas a acolhendo quando delineada em clareza. Posso dizer que nossa relação foi fraterna, construtiva e, sobretudo, marcada por sua lealdade exemplar, que me esforcei para responder com a mesma força. Jamais precisamos de papéis assinados para firmar decisões e para as cumprir.
Octavio também teve pela frente, particularmente nos primeiros meses de 1969, a situação política nacional em plena fase dos atos institucionais, complicada e policialesca, contraposta aos esforços para manter a Folha na ascensão que a levou a se tornar o diário independente e pluralista de maior circulação no Brasil. Aquilo que parecia simultaneamente impossível, recuperar a Fundação Cásper Líbero e manter a caminhada da Empresa Folha da Manhã S/A, foi alcançado por Octavio com a paciência e o empenho das grandes empreitadas, após ele ter assumido o controle exclusivo da Folha.
Ações foram movidas pelo governo federal contra o jornal. A empresa tinha excelentes advogados, mas participei em algumas delas. Além da defesa judicial, havia necessidade de esclarecer o público leitor a respeito de execuções absurdas. Octavio me surpreendeu muitas vezes na busca de explicação mais clara e transparente para o fim visado. A discordância vigorosa estimulou a busca do equilíbrio, sem criar uma só situação em que o desencontro de posições originasse estremecimento. Ele freqüentemente contribuiu para achar a fórmula precisa do direito.
Houve sacrifícios emocionais, superação de situações pessoais. Houve o combate das dificuldades tributárias e previdenciárias, de origem política, mas sempre olhadas de frente. As lembranças resumidas daqueles decênios compõem o leque de percursos, às vezes tomando horas diárias, às vezes em longos intervalos, em particular na variedade de tempos agitados, em que serviu de exemplo marcante a venda da antiga Estação Rodoviária. De tudo fica a sensação da tarefa cumprida, a compor linhas de amizade tão sólida, que só me permitiu escrever essas palavras após passadas semanas da morte de Octavio. Tempo para serenar o espírito e avaliar o significado de sua perda para a família, para o jornalismo e para mim. Foi Octavio quem, há dezenas de anos, me convenceu a escrever esta coluna. Os dias passados amadureceram a idéia de, na sua ausência, homenageá-lo com carinho.


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