UOL


São Paulo, quarta-feira, 26 de novembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

RIO

Pessoas que vivem a até 25 km da central de abastecimento vasculharam ontem a área incendiada atrás de comida e objetos

Morador distante adere a saque na Ceasa

FABIANA CIMIERI
DA SUCURSAL DO RIO

O terceiro dia consecutivo de saques à Ceasa (Centrais de Abastecimento do Rio de Janeiro S.A.), em Irajá, zona norte do Rio de Janeiro, foi marcado pela presença de moradores de localidades carentes a até 25 km de distância.
Havia cerca de 400 pessoas escavando ontem os escombros do pavilhão 43 da Ceasa, parcialmente incendiado no fim de semana.
Eliete Nascimento, 30, desempregada há nove anos, era uma delas. Ex-empregada doméstica, ela disse que não pôde vir nos dois primeiros dias por não ter dinheiro para pagar a passagem dos dois ônibus que tem que pegar para vir de Belford Roxo, município na Baixada Fluminense, onde mora. A cidade fica a 15 km da Ceasa.
Nascimento chegou ontem de madrugada com dois dos cinco filhos: Cíntia, 9, e Douglas, 10. Ainda estava escuro quando, com centenas de pessoas, começou a revirar destroços fumegantes.
Ao amanhecer, cortou o pulso direito em um vergalhão. Levou sete pontos, mas não desistiu. Voltou para levar o que juntara.
Enquanto as crianças, descalças, procuravam comida, a desempregada esvaziava 13 latas de achocolatado num saco plástico: "Fica mais fácil para levar no ônibus".
A dona-de-casa Maria da Silva, 56, veio com dois netos de Saracuruna (a 25 km da Ceasa), distrito de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. "Vim arrumar uma comidinha extra para ajudar."
Clélia Santos Alves, 65, veio de Niterói (25 km do entreposto). "O salarinho de fome de meu marido não dá para comprar coisas como pasta de dente e sabonete", disse.
À tarde, o Corpo de Bombeiros encerrou o rescaldo. Apesar de, às 10h, ter vetado a entrada no local, não conseguiu conter os saques.
Policiais militares que faziam a segurança na área disseram ter ordens para impedir a invasão, mas que não tinham como conter as pessoas por falta de efetivo. De manhã, a Folha contou cinco carros policiais ao redor do pavilhão incendiado e foi informada de que não havia oficiais no local.
A central está cercada por 21 favelas de bairros como Irajá, Pavuna, Vicente de Carvalho e Costa Barros, entre outros. Nelas vivem, segundo o Censo 2000 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 99.682 pessoas.
Entre as favelas estão algumas que a polícia considera perigosas, como a da Lagartixa e os morros do Juramento e da Pedreira -redutos do traficante mais procurado do Rio de Janeiro, Paulo César da Silva Santos, o Linho, líder da facção TC (Terceiro Comando).


Texto Anterior: Capela do Museu Cândido Portinari será restaurada
Próximo Texto: Violência: Sobel recua e critica pena de morte
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.