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ABASTECIMENTO
Projeto criado pelo governo pretende desestimular o desperdício de água e a poluição de rios
Empresas vão pagar por uso de água
MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília
O governo vai cobrar tarifas de
indústrias e de empresas de abastecimento de água e saneamento
pelo uso das águas e pelo lançamento de resíduos e esgoto em
rios.
A medida está pronta para ser
submetida ao Congresso e faz
parte do pacote destinado a pôr
ordem no uso da água -considerado um bem público ""esgotável"
e dotado de valor econômico.
Trata-se de uma prioridade da
pauta política do governo para
depois do recesso parlamentar.
A cobrança pelo uso da água,
até agora limitada aos produtores
de energia elétrica, poderá aumentar em até 1,5% o preço dos
produtos dessas empresas, inclusive as contas de água e esgoto, assim como o preço dos produtos
da agricultura irrigada, segundo
estimativas ainda preliminares da
Secretaria de Recursos Hídricos
do Ministério do Meio Ambiente.
A idéia da tarifa é desestimular o
desperdício de água e a poluição
de rios em áreas de grande concentração populacional e de indústrias, ou onde a água é escassa,
como na região Nordeste.
O principal alvo são os usuários
de água na bacia do rio Paraíba do
Sul, que se estende pelos Estados
de São Paulo, do Rio e de Minas,
numa região que concentra 10%
da geração do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro. A bacia é
apontada como a área de maior
conflito por água no país.
Não se cogita cobrar pela água
de pequenos núcleos habitacionais ou de pequenos empreendimentos, nem em regiões onde a
água é abundante, como o Norte.
O dinheiro será arrecadado pela
futura Agência Nacional de Água,
batizada de ANA, que funcionará
como as agências de energia elétrica (Aneel), de telecomunicações (Anatel) e do petróleo
(ANP), cujos dirigentes têm mandato fixo.
A criação da ANA é apontada
como um pré-requisito importante à privatização das empresas
de saneamento, um dos principais negócios do segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso.
""Não é para reforçar os cofres
públicos da União, nem dos Estados, mas um valor simbólico para
ajudar a manter as bacias", insistiu Raymundo Garrido, secretário
de Recursos Hídricos. O dinheiro
será repassado a comitês de administração das bacias, mediante
contratos de gestão.
Responsável pela redação dos
projetos de lei que criam a ANA e
definem o sistema de gestão dos
recursos hídricos, Garrido identifica os produtores de energia elétrica como potenciais adversários
da idéia. O setor elétrico perderia
o poder que detém hoje de administrar os rios e teme ver aumentada a carga de tarifa. Atualmente,
as empresas já pagam cerca de R$
550 milhões por ano aos Estados e
municípios a título de compensação financeira.
O governo estuda a aplicação de
parte desse dinheiro na recuperação da qualidade das bacias, o que
poderia atingir Tesouros estaduais e municipais. Essa alternativa abriria outra provável frente de
resistência ao projeto.
""A pior hipótese para o setor seria a ausência de gestão e a contínua disputa pelo uso da água",
alega Garrido. ""Hoje não existe
gestão hídrica, é a lei das selvas",
resume Jerson Kelman, especialista em recursos hídricos e consultor do Ministério do Meio Ambiente.
Exemplo dessa ""lei das selvas" é
o uso tradicional dos rios no país.
Os usuários se apropriam livremente dos rios para captar ou
despejar poluentes sem zelar pelos usuários que lançarão mão de
suas águas mais abaixo.
O principal instrumento de gestão do uso das águas é a outorga,
concedida pela União ou pelos
governos estaduais, dependendo
do rio. A autorização vale pelo
prazo de 35 anos, podendo ser renovada por períodos de dez anos.
A outorga não garante aos usuários da água sua disponibilidade
incondicional. Outra novidade
dos projetos é a possibilidade de a
água ser racionada. "O direito de
uso de recurso hídrico tem natureza relativa, ficando o seu exercício condicionado à disponibilidade hídrica e ao regime de racionamento", diz um dos projetos.
Antes de ser encaminhados ao
Congresso no início de agosto, os
projetos serão discutidos em seminário no Palácio do Planalto. O
Estado de São Paulo também estuda cobrar pela água.
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