São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

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Detento troca colaboração por regalia

DA REPORTAGEM LOCAL

Preso chamado de doutor, que anda fora da cadeia, sem algemas, participa de festas com bebidas alcoólicas e que até visita a família. A "parceria" entre detentos e PM era recompensada com regalias e promessas de transferência, de redução de pena e de dinheiro.
Os gritos ouvidos por vizinhos durante a invasão de uma casa no Brooklin (zona sul), no dia 31 de março deste ano, revelaram que a colaboração à PM também rende status ao preso.
De acordo com um morador, que não quis se identificar, o preso recapturado no local gritava "traidor". A ofensa era direcionada a outro preso que ajudou a polícia na localização da casa.
Segundo o mesmo morador, outro homem respondeu: "Lava a sua boca para falar do doutor". O morador também citou o nome do preso chamado de doutor. É o mesmo nome apontado no relato da ação feito pelo Gradi ao juiz-corregedor dos presídios.
O preso recapturado, em depoimento no COC, também disse ter sido traído pelo outro detento, cujo nome foi citado pelo morador. O suposto traidor é assaltante de banco e, segundo o relato do preso do COC, exercia certa influência sobre as operações feitas em "parceria" com a PM.
O morador também disse que viu um dos presos recapturados frequentar a mesma casa com uma moto meses antes da invasão pela PM. Um tenente do Gradi também costuma usar uma moto para fazer suas investigações.
O próprio preso, em depoimento no COC, relata que ele, outros três detentos condenados e PMs participaram de uma festa, com bebidas alcoólicas, em uma padaria da zona norte, dois dias antes da suposta tortura.
Familiares de um dos presos confirmam as regalias para os colaboradores. Dois dias antes da invasão no Brooklin, um dos detentos foi levado à casa de parentes por policiais do Gradi.
O detento estava sem algemas, acompanhado de dois PMs à paisana que conversavam e agiam amigavelmente com ele. Eles chegaram em um carro descaracterizado, provavelmente um Celta, mesma marca do carro da PM usado pelos detentos para fugir.
Na ocasião, ele disse que estava colaborando com a polícia fazia alguns dias e que, em troca, receberia "algum dinheiro", mas não falou em valores. Esse dinheiro seria destinado aos filhos dele.
O preso disse que deixou de ajudar a família porque o serviço que realizava na prisão, encomendado por uma empresa de fora da cadeia, foi suspenso. Mas que o trabalho de colaboração com a polícia iria resolver suas dificuldades financeiras.
Para Chacal, um preso que também colaborava com a PM, mas que foi morto por engano pela própria polícia em julho do ano passado, a promessa foi de redução de pena. Foi o que o preso disse, por telefone, à mãe antes de sair para uma operação e levar três tiros.


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