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SAÚDE
Isoflavonas reduzem tumores em camundongos
"Hormônio" da soja
pode combater câncer
MARCELO LEITE
enviado especial a Londrina (PR)
Se você não consegue encarar soja como alimento, comece a pensar
nela como remédio. Proliferam as
pesquisas sobre as isoflavonas, um
tipo de hormônio presente no
grão, que seriam capazes de atacar
do câncer à osteoporose. Em cobaias, já provaram que reduzem
tumores de mama.
O tema teve destaque no primeiro Congresso Brasileiro de Soja, há
dez dias, em Londrina (PR). A ele
foi dedicada a principal palestra,
dada por Stephen Barnes, 53, da
Universidade do Alabama (EUA).
Ele disse que este ano deverão ser
publicados mais de mil artigos
científicos sobre isoflavonas.
Os Institutos Nacionais de Saúde
dos Estados Unidos (NIH) estão
investindo pesado para descobrir
efeitos benéficos da soja. Pelos cálculos de Barnes, os NIH destinam
cerca de US$ 7 milhões a US$ 10
milhões por ano ao assunto.
Um dos estudos citados por Barnes que mais chamou atenção da
platéia foi publicado no ano passado. Pesquisadores do Japão testaram o efeito de um preparado tradicional de soja, o missô (espécie
de sopa), em ratinhas com propensão para o câncer de mama.
No grupo de controle, que recebeu preparados inócuos (placebos), os tumores cresceram. Outro
grupo foi tratado com uma das
drogas mais usadas hoje, o tamoxifeno. Houve crescimento dos tumores, mas menor (veja gráfico).
Para o terceiro grupo foi ministrada uma mistura de tamoxifeno
com missô. Nesse caso, surpreendentemente, ocorreram as únicas
diminuições de tumores.
Isso acontece, acreditam pesquisadores, porque as isoflavonas têm
muita semelhança com os estrógenos, classe de hormônios femininos que regulam crescimento e
funções de órgãos como útero e
mamas (e podem estar envolvidos
no surgimento do câncer).
As isoflavonas são por essa razão
classificadas como fitoestrógenos,
ou estrógenos vegetais. Sua grande
vantagem parece ser a de atuarem
como um estrógeno muito fraco,
ou até como antiestrógeno.
Tais propriedades fazem das isoflavonas uma alternativa promissora para os compostos sintéticos
usados na prevenção de tumores
de mama. O tamoxifeno pode preveni-los, mas aumenta o risco de
câncer no útero.
"As isoflavonas em uma dieta de
soja podem ter um papel na prevenção do câncer, osteoporose e
doenças cardíacas. Definitivamente, não estão associadas com câncer de útero, quase desconhecido
no sudeste da Ásia, nem com outros efeitos colaterais relatados do
tamoxifeno", disse Barnes.
Torta de chocolate e soja
Inglês de nascimento, o químico
da Universidade do Alabama é casado com uma pesquisadora de
origem coreana, Helen Kim, 51.
Entusiastas da soja, até receitas de
tortas de chocolate com o improvável ingrediente distribuíram em
Londrina, durante o congresso.
Uma de suas sugestões é substituir até 30% de farinha de trigo por
farinha de soja, na preparação de
massas. O único cuidado, dizem, é
adicionar mais água à receita.
Não é tarefa simples mudar hábitos alimentares e incluir neles o
que hoje é mais conhecido como
componente de ração para gado.
Jovens, em especial, seriam os
mais refratários, precisamente o
principal alvo da cruzada do casal.
Segundo Barnes, experimentos
com camundongos mostraram
que as isoflavonas, como a genisteína, são ainda mais eficazes
quando consumidas na juventude.
Nessa época há intensa multiplicação de células na mama, portanto
maior oportunidade para mutações -e futuros tumores.
"Adolescentes e mulheres jovens: essa é a época de prevenir",
diz Barnes. Como os resultados
"ainda são controversos", recomenda ingerir soja como alimento
(25-50 gramas por dia), e não concentrados de isoflavonóides.
Outro problema causado pela diminuição dos estrógenos, na pós-menopausa, é a osteoporose. A falta desses hormônios leva à perda
de massa dos ossos, tornando-os
propensos a fraturas.
Também nesse caso observou-se
uma ação benéfica das isoflavonas
da soja. O teste foi feito com ratinhas cujos ovários (fontes de estrógenos) haviam sido retirados.
Comparou-se o efeito da isoflavona genisteína com Premarin,
usado na terapia de reposição hormonal. A genisteína foi a mais eficiente na retenção de massa óssea
(veja quadro).
Mais recente é o estudo do efeito
dos estrógenos, ou da falta deles,
na cognição. Essa é a especialidade
da química Helen Kim, que não
participou formalmente do congresso.
"Quando se retiram os ovários de
camundongos, eles se tornam modelos não só para osteoporose,
mas também para deficiência cognitiva", disse Kim à Folha. "Agora
estamos usando soja para ver se
pode preveni-la, também."
Segundo a química, da mesma
Universidade do Alabama, o estudo pode auxiliar na prevenção do
mal de Alzheimer, que ataca mais
mulheres idosas do que homens.
O jornalista
Marcelo Leite viajou a Londrina a
convite da Embrapa.
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