São Paulo, Domingo, 30 de Maio de 1999
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SAÚDE
Benefício de cirurgia divide cardiologistas

AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local

O que é melhor para o paciente cardíaco, passar por uma cirurgia como as de ponte de safena ou fazer tratamento com remédios?
A questão divide os maiores especialistas brasileiros e duas pesquisas, uma americana e outra no Brasil, incendiaram a polêmica.
A pesquisa americana, publicada pelo "New England Journal of Medicine", questionou os benefícios das cirurgias e angioplastias (dilatação de artérias com ajuda de um cateter). O estudo separou em dois grupos 920 pacientes que sofreram um tipo de infarto do miocárdio de gravidade leve ou moderada.
Um grupo passou por cirurgia ou angioplastia. Outro, recebeu medicamento. O resultado foi favorável aos medicamentos: a taxa de morte e de novos ataques cardíacos foi menor após um mês e após um ano entre aqueles que só tomaram remédio.
O estudo brasileiro, conduzido pelo médico Whady Hueb, do Instituto do Coração de São Paulo, observou que pacientes submetidos a cirurgia, angioplastia ou medicamento tiveram evolução semelhante.
"A cirurgia é uma violência", diz Hueb. "Em dez anos, as doenças do coração serão tratadas por cateter, e a cirurgia será restrita a casos excepcionais."
"A cirurgia é uma dádiva para muitos e continuará salvando vidas", rebate Sérgio de Almeida Oliveira, chefe do grupo de cirurgia torácica do Incor e um dos maiores especialistas em pontes de safena.
O estudo americano é contestado por outros especialistas que o consideram inconclusivo e distorcido por colocar num "mesmo saco" pacientes em diferentes situações clínicas, graves e não graves.
Para eles, vários trabalhos já demonstraram que as pessoas operadas têm melhor qualidade de vida e maior sobrevida comparadas com as tratadas com remédios.
O único consenso entre os médicos é que, por enquanto, a cirurgia de ponte de safena vem trazendo benefícios inquestionáveis. "É possível que daqui a 20 anos se descubra que estamos fazendo coisa errada, mas hoje a cirurgia vem salvando muitas vidas", diz o cardiologista clínico Bernardino Tranquesi.
Mas a evolução da medicina, os métodos de diagnósticos e o conhecimento da doença coronariana vêm provocando mudanças na escolha dos procedimentos.
Um infartado de 60 anos com certeza receberia uma ou mais pontes de safena se fosse internado no início dos anos 70. "Naquela época, quase todas as lesões tinham a indicação de cirurgia", diz Tranquesi.
Cinco anos atrás, o mesmo paciente poderia ser salvo com uma angioplastia. Hoje, é possível que venha a ser tratado com drogas.
Adib Jatene, diretor-geral do Incor, lembra que "não se deve tratar todo mundo da mesma forma", como fez a pesquisa norte-americana. "Apenas os pacientes com risco de vida ou risco de um infarto extenso são operados. A cirurgia, hoje, é indicada para um grupo de apenas 15% a 20% das pessoas com doenças coronárias."
Diante do leque do opções, a escolha do procedimento mais adequado é hoje um desafio para os médicos. "O segredo da arte está em indicar o melhor caminho para cada paciente", diz Enio Buffolo, professor titular de cirurgia cardiovascular da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) .
Ou seja, a vantagem de um ou outro método vai depender das condições clínicas do paciente.


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