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Pioneiro, Juneca atua hoje como grafiteiro
DA REPORTAGEM LOCAL
"Cão Fila - Km 26". "Gonha Mó
Breu". "Eternamente". "Juneca e
Pessoinha". Que atire a primeira
lata de aguarrás quem nunca se
pegou olhando para o muro e
pensando o que significavam
aquelas palavras pichadas. Estamos na cidade de São Paulo no final dos anos 70, começo dos 80.
O primeiro era uma forma original e demasiadamente sucinta
do criador Antenor Lara Campos
de divulgar seu canil de filas brasileiros, que ficava na ilha do Sabiá,
no meio da represa Billings, para a
qual se deveria pegar a balsa exatamente no quilômetro 26 da estrada do Eldorado, em São Paulo.
O segundo é polêmico até hoje.
Há quem defenda que era código
para a frase "maconha dá o maior
barato", como disse à Folha o engenheiro Reginaldo Assis Paiva,
diretor-secretário do Instituto de
Engenharia de São Paulo e estudioso informal do assunto.
Já o terceiro é exemplar típico
da pior poesia da época do desbunde e geralmente vinha desdobrado nos versos "Eternamente/
É ternamente/ Eterna mente/ Éter
na mente". Mas foi o quarto que
mais discussão suscitou. Quem
afinal era Juneca? E Pessoinha?
Ambos eram meninos paulistanos que, sem saber, faziam história ao iniciar a atual fase de pichação, que privilegia as assinaturas.
Pessoinha, Antônio Pessoa, hoje é
advogado. E Juneca "virou a casaca", como disseram vários pichadores à Folha: é grafiteiro.
Grafiteiro reconhecido, com
três mostras no MIS (Museu da
Imagem e do Som) e no Masp
(Museu de Arte de São Paulo) e
exposições na França. "Fui perseguido como pichador, principalmente pelo Jânio, que mandou
nos prender", disse Oswaldo Junior, 38, o Juneca, referindo-se ao
ex-prefeito de São Paulo.
Hoje, depois de fazer acordo
com a empresa responsável, grafita os relógio/termômetros públicos espalhados por São Paulo
quando estes estão sem anunciantes ou entre contratos. "Tenho uma galeria de 400 pontos."
A "conversão" de Juneca desperta uma polêmica nunca resolvida: por que a sociedade considera grafite uma forma de arte e
nega esse status à pichação? "Essa
discussão é datada", diz a curadora e crítica Lisette Lagnado, para
quem há tanto pichações interessantes como grafites horríveis.
Opinião mais radical tem o estudioso Arthur Lara. "A verdadeira arte hoje parece vir mesmo dos
pichadores, porque o grafiteiro
ou ficou bonzinho ou virou mera
cópia dos americanos."
(SD)
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