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São Paulo, segunda-feira, 30 de junho de 2003

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Pioneiro, Juneca atua hoje como grafiteiro

DA REPORTAGEM LOCAL

"Cão Fila - Km 26". "Gonha Mó Breu". "Eternamente". "Juneca e Pessoinha". Que atire a primeira lata de aguarrás quem nunca se pegou olhando para o muro e pensando o que significavam aquelas palavras pichadas. Estamos na cidade de São Paulo no final dos anos 70, começo dos 80.
O primeiro era uma forma original e demasiadamente sucinta do criador Antenor Lara Campos de divulgar seu canil de filas brasileiros, que ficava na ilha do Sabiá, no meio da represa Billings, para a qual se deveria pegar a balsa exatamente no quilômetro 26 da estrada do Eldorado, em São Paulo.
O segundo é polêmico até hoje. Há quem defenda que era código para a frase "maconha dá o maior barato", como disse à Folha o engenheiro Reginaldo Assis Paiva, diretor-secretário do Instituto de Engenharia de São Paulo e estudioso informal do assunto.
Já o terceiro é exemplar típico da pior poesia da época do desbunde e geralmente vinha desdobrado nos versos "Eternamente/ É ternamente/ Eterna mente/ Éter na mente". Mas foi o quarto que mais discussão suscitou. Quem afinal era Juneca? E Pessoinha?
Ambos eram meninos paulistanos que, sem saber, faziam história ao iniciar a atual fase de pichação, que privilegia as assinaturas. Pessoinha, Antônio Pessoa, hoje é advogado. E Juneca "virou a casaca", como disseram vários pichadores à Folha: é grafiteiro.
Grafiteiro reconhecido, com três mostras no MIS (Museu da Imagem e do Som) e no Masp (Museu de Arte de São Paulo) e exposições na França. "Fui perseguido como pichador, principalmente pelo Jânio, que mandou nos prender", disse Oswaldo Junior, 38, o Juneca, referindo-se ao ex-prefeito de São Paulo.
Hoje, depois de fazer acordo com a empresa responsável, grafita os relógio/termômetros públicos espalhados por São Paulo quando estes estão sem anunciantes ou entre contratos. "Tenho uma galeria de 400 pontos."
A "conversão" de Juneca desperta uma polêmica nunca resolvida: por que a sociedade considera grafite uma forma de arte e nega esse status à pichação? "Essa discussão é datada", diz a curadora e crítica Lisette Lagnado, para quem há tanto pichações interessantes como grafites horríveis.
Opinião mais radical tem o estudioso Arthur Lara. "A verdadeira arte hoje parece vir mesmo dos pichadores, porque o grafiteiro ou ficou bonzinho ou virou mera cópia dos americanos." (SD)


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