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MENINOS DO RIO
"Queria eu ter sido assassinada", diz mãe de atendente encontrado morto em praia
Morte que provocou ato no Leblon é a 3ª em família de cobradora
FERNANDA MENA
DA SUCURSAL DO RIO
Na tarde de anteontem, Maria
Bernadete Santos da Conceição,
59, enterrou um filho pela segunda vez: Rodrigo Santos da
Conceição, 19, cujo corpo fora
encontrado baleado, desencadeando uma onda de protestos e
vandalismo no Leblon, no Rio.
A ex-cobradora de ônibus,
aposentada por conta de uma
disfunção cardíaca, já perdeu
três dos seis filhos. O terceiro,
Bernadete diz velar em pensamento, já que o corpo do garoto
de 16 anos nunca foi achado.
Mas a família imagina que ele
tenha tido o mesmo destino dos
outros dois irmãos mortos: seqüestro seguido de espancamento, execução a tiros e abandono do corpo em local ermo.
Moradora da Cruzada de São
Sebastião, um complexo habitacional de 945 apartamentos que
abriga moradores da antiga favela da praia do Pinto, já demolida, Bernadete divide um apartamento de 30 m2 com seis parentes e se diz aterrorizada: "Tenho muito medo de que isso
aconteça a meus outros filhos.
Queria eu ter sido assassinada".
Rodrigo, atendente de uma
lanchonete Bob's desde 2002, foi
encontrado próximo à praia de
Grumari, na zona oeste do Rio,
com sinais de espancamento e
ferimentos a tiros que atingiram
a cabeça, o coração, os pulmões,
o fígado e o rim.
Moradores da Cruzada São
Sebastião, revoltados com a
morte de Rodrigo, incendiaram
anteontem um ônibus e depredaram outro, sem deixar feridos. "A população fez uma coisa
inédita contra uma injustiça.
Normalmente, em casos de violência, todos ficam acuados,
mas, desta vez, a comunidade
reagiu com indignação", disse
um irmão de Rodrigo, de 35
anos, que não quis se identificar.
"Só posso dizer o seguinte: sábado, participei da Corrida pela
Paz, pouco antes de meu irmão
ser morto brutalmente", disse.
Rodrigo foi visto pela última
vez no sábado. Ao chegar do trabalho, de madrugada, testemunhas dizem ter visto Rodrigo e
dois amigos serem abordados
por dois homens e uma mulher
num Gol branco sem placas.
Segundo eles, o motorista e os
passageiros do Gol teriam se
identificado como P2 (integrantes da Polícia Militar reservada,
que atua à paisana) e pedido ao
colega de Rodrigo que trouxesse
da comunidade R$ 5.000 para
que o garoto fosse liberado, ou
seriam acusados de tráfico.
"Quem vai dar R$ 5.000 para
liberarem o garoto? Se ele fosse
envolvido com o tráfico, tinha a
quem pedir. Mas ele era trabalhador", disse Ely Carvalho, 56,
tia de Rodrigo.
Vinte minutos depois, sem o
retorno do colega de Rodrigo ou
do dinheiro, o garoto teria sido
algemado e colocado no interior
do veículo, segundo moradores.
Ninguém, no entanto, quer se
identificar ou prestar testemunho à polícia sobre o caso, por
medo de represálias. "Ninguém
quer ter o mesmo fim do Rodrigo", disse um amigo da vítima.
A delegada do 16º DP -onde
foi registrado o encontro do cadáver-, Soraia Santana, disse
que foi aberto inquérito para
apurar o caso e que o laudo da
perícia no local onde o corpo foi
encontrado deve sair em 20 dias.
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