São Paulo, domingo, 30 de dezembro de 2001

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ESTRADAS

Local é o mais crítico de acidentes e mortes; por falta de licença ambiental, obras na serra do Cafezal não saíram do papel

Duplicação da Régis emperra no pior trecho

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Promessa do primeiro mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, a duplicação da Régis Bittencourt em São Paulo permanece emperrada no trecho mais crítico de acidentes e mortes das estradas federais paulistas.
Os 30 km da serra do Cafezal, região nativa de mata atlântica entre os municípios de Juquitiba (78 km de SP) e Miracatu (180 km de SP), estão sem autorização ambiental e integram a única região dos 300 km da rodovia no Estado sem ter as obras concluídas ou encaminhadas até agora.
Esse trecho faz a Régis, principal ligação de São Paulo à região Sul, ser conhecida como a "rodovia da morte". Em 1999 e 2000, 57 pessoas morreram na serra do Cafezal, que também registrou 917 acidentes -mais de um por dia.
A quantidade de mortes é, proporcionalmente à sua extensão, 46% superior à do restante da estrada. Também supera em 48% a registrada na Presidente Dutra, que liga a capital paulista ao Rio.

Desentendimentos
O impasse que já dura quase sete anos se deve a desentendimentos entre órgãos ambientais, Ministério Público Federal e DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem). Eles divergem sobre os traçados da duplicação e os estudos técnicos, ambientais e arqueológicos já feitos.
O DNER, após análises do IME (Instituto Militar de Engenharia), chegou a obter uma licença ambiental prévia do Consema (Conselho Estadual do Meio Ambiente) para a obra em 1996.
A autorização foi contestada pelo Ministério Público sob a alegação de que a estrada, por ser federal, deveria ter aval do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). O órgão aguarda um parecer do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), pedido pelos procuradores, para decidir sobre a concessão da nova licença.
"Eu acho que não está demorando. Há uma série de instituições atuando simultaneamente. É uma engenharia política. Precisamos chegar a uma solução consensual. Temos que tapar todas as brechas, senão alguém entra na Justiça e barra depois", afirma Wilson Almeida Lima, gerente-executivo do Ibama.
Segundo a Folha apurou, um diretor do instituto cobrou do Ministério Público esse parecer no último dia 20. O prazo para a execução se esgotou em novembro.
Os técnicos do DNER defendem que, para a duplicação da Régis na serra do Cafezal, seja construída uma pista distanciada da atual. Os ambientalistas querem um traçado diferente: apenas a ampliação paralela da pista existente.

Deslizamentos
"Eles exigem que a estrada fique colada na de hoje. Mas os morros são altos e qualquer deslizamento de terra cobriria as pistas. A operação da rodovia ficaria fragilizada. Não dá para imaginar a possibilidade de deixar parte do corredor do Mercosul interrompida", afirma Deuzedir Martins, diretor do DNER no Estado, em referência ao nome dado pelo governo federal ao projeto de duplicar toda a extensão da Régis, nas regiões Sul e Sudeste, para reduzir os custos do transporte de carga.
Segundo ele, dos 30 km envolvidos na duplicação da serra, os questionamentos se concentram em uma área de 2 km da fazenda Itereí, utilizada para passeios e viagens turísticas.
"Há outros trechos em que a nossa proposta também entra na mata, mas só esse é questionado", afirma o diretor do DNER.
"O DNER não quer fazer um estudo profundo da outra alternativa de duplicação. A sociedade tem direito de conhecer as duas propostas. Qualquer alternativa vai degradar, não há área boa ambientalmente, mas tudo precisa ser bem estudado", diz a procuradora do Ministério Público Federal Inês Virgínia Soares.
Ela afirma que, mesmo com a licença do Ibama, a obra não poderá começar por falta de estudos arqueológicos da região.
O DNER afirma que eles foram feitos pelo órgão estadual do patrimônio histórico na primeira fase do projeto, antes de 1997, e que novas análises estão sendo concluídas pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

Riscos de acidentes
A procuradora Inês nega que os atrasos da obra sejam culpa do Ministério Público Federal e diz que os riscos pelos acidentes são de responsabilidade do DNER. "As mortes são gravíssimas. Podemos até propor uma ação por improbidade administrativa."
O diretor do órgão alega que, desde 1996, época das primeiras contestações ambientais, já foram atendidos "todos os pedidos de modificações possíveis". "O projeto já foi bastante alterado", afirma Martins, citando uma redução de 190 mil m2 para 57 mil m2 na área de desmatamento e de 2.330 metros para 1.500 metros na de túneis.


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