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SAÚDE
Perfil de mulheres que interrompem a gravidez, divulgado por pesquisadora, mostra que famílias ignoram gestação
Aborto clandestino mata as mais jovens
AURELIANO BIANCARELLI
enviado especial a Águas de Lindóia
Quase 20% das mulheres que tiveram complicações com aborto
clandestino e foram internadas em
hospitais públicos da cidade de
São Paulo tinham 19 anos ou menos. Outras 53% tinham entre 20 e
39 anos.
Entre as oito mulheres que morreram de aborto em 1994 em São
Paulo, três tinham 17 anos ou menos e estavam na 7ª série. Todas
eram católicas, moravam na periferia e suas famílias não sabiam
que estavam grávidas.
Esse perfil das mulheres que fazem aborto e das que morrem vítimas dele aparece em estudo apresentado no 5º Congresso Brasileiro
e Paulista de Saúde Coletiva, que
aconteceu em Águas de Lindóia.
A autora da pesquisa, a enfermeira e professora da Unifesp
(Universidade Federal de São Paulo) Lucila Amaral Vianna, trabalhou apenas com autorizações de
internação hospitalar (AIHs) dadas pelo Ministério da Saúde a
hospitais de São Paulo em 1994.
Dentre as 160.770 internações
por causas maternas, 15.788 -ou
9,8%- foram atribuídas a "aborto não especificado".
O número real de abortos é muito maior, ressalva a autora. De um
lado, estima-se que as internações
na rede pública de São Paulo representem 60% do total.
No caso do aborto, por ser um
procedimento ilegal, o número de
mulheres que recorreriam a clínicas privadas seria muito maior do
que os 40% que têm planos de saúde ou pagam serviços privados.
Por outro lado, há um número
desconhecido de mulheres que fazem aborto e não precisam recorrer a hospitais.
Os estudos indicam que o número de abortos corresponderia a
cerca de 20% do total de nascimentos. Por essa regra, cerca de 400 mil
abortos provocados aconteceriam
por ano na cidade de São Paulo.
Quanto aos óbitos por aborto, os
pesquisadores partem do princípio de que o número de mortes notificadas é metade dos casos reais.
Assim, pelo menos 16 mulheres
teriam morrido em decorrência de
aborto em São Paulo em 1994.
"Já o número de sequelas decorrentes do aborto provocado é desconhecido, mas certamente muito
grande", diz Lucila.
A idade das mulheres que morreram por aborto mostra que um
trabalho de informação e atenção
deve começar na escola, afirma a
pesquisadora. "Todas procuraram ajuda médica muito tarde",
diz. "Todas morreram em grande
solidão, pois não tinham informado nem suas famílias."
Sete das oito vítimas eram solteiras e uma, separada. Sete morreram em hospitais da periferia e a
oitava em casa. Em um dos casos,
o aborto foi provocado com uma
sonda. Nos outros, os métodos
não foram identificados.
"A descriminalização do aborto
diminuiria muito o número de
mortes e de sequelas e reduziria o
número de abortos", diz Lucila.
Aureliano Biancarelli viajou a convite da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva)
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