São Paulo, Domingo, 31 de Outubro de 1999
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DO LADO DE FORA
Para 50% das famílias dos infratores, governo poderia ter evitado o problema
Famílias culpam o Estado e buscam solução na religião




da Reportagem Local


As famílias dos menores infratores apontam o governo do Estado como o principal responsável pelo conduta desviante dos adolescentes.
Para 50% delas, se os menores tivessem boas escolas, chance de praticar esporte e emprego, eles não teriam cometido os delitos que os levaram à internação.
O dado foi levantado por uma pesquisa feita pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, na qual foram ouvidos os chefes das famílias de 292 adolescentes infratores internados.
"O governo deveria fazer alguma coisa pelos jovens para ocupar o tempo deles", resumiu a madrasta de um adolescente.
"A diretora da escola expulsou o meu filho. Para ela, meu filho era bandido e tinha que ficar junto com bandidos", completou a mãe de outro, alegando que a expulsão aumentou a "revolta" do menino.
"Aqui é assim: quando consideram que o aluno não tem comportamento, as professoras já avisam para nenhuma escola aceitar a matrícula."
A preocupação com a falta de estudo e de chances de trabalho se reflete nas primeiras reações dos familiares. Ao receber o pesquisador, uma das perguntas mais comuns da família era se a entrevista era "para ajudar o menino a conseguir emprego".
A insatisfação com o governo também aparece entre as famílias que não quiseram dar informações, segundo o professor Rubens Adorno, um dos coordenadores do estudo.
"Pelo menos oito famílias se recusaram a falar alegando ceticismo em relação ao governo ou à Justiça ou dizendo que já haviam sido bastante incomodadas pelo fato de terem um filho "preso"."
Na segunda posição no ranking das possíveis soluções apontadas pelas famílias para o problema da criminalidade juvenil aparece a religião. Para 12% delas, se o adolescente frequentasse a igreja, ele não teria cometido o delito.
A crença se reflete no comportamento dos próprios membros das famílias: 40% declararam estar frequentando cultos evangélicos e 24% disseram ser católicos.
Além do governo e da religião, pais mais responsáveis, internações e Deus aparecem entre as outras possíveis soluções.
Apesar das críticas às instituições, 34% das famílias afirmaram não ter tomado nenhum providência ao notar que o menor estava envolvido com criminosos.

A volta
As famílias dos infratores classificam a Febem como a "escola possível", mas pelo menos 25% delas temem a volta do menor para casa.
"Elas dizem que o menor vai voltar a usar drogas, está jurado de morte ou vai trazer problemas para a família", diz Adorno.
A ida para a Febem é tida como uma "perda moral" por pais e irmãos, mas a fundação aparece como uma instituição correcional, em oposição à escola que expulsa.
"Meu filho gosta de uma rua, não sei por quê. Eu não tenho como segurá-lo", afirmou uma das mães que vêem na Febem uma chance de recuperação.
(SÍLVIA CORRÊA)

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