São Paulo, quinta-feira, 01 de fevereiro de 2001

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Analistas aprovam corte, mas desaceleração preocupa

LEONARDO SOUZA
DA REPORTAGEM LOCAL

"O que os juros de curto prazo dos Estados Unidos têm a ver comigo?" Essa é uma pergunta que muitos brasileiros se fazem quando o Fed (o banco central dos EUA) mexe na taxa básica do país.
O comportamento dos "Fed Funds" (juros de curto prazo dos EUA) pode influenciar os juros do financiamento do seu carro, incentivar a empresa para a qual você trabalha a investir mais na produção e, por consequência, a contratar mais empregados, entre muitas outras coisas.
Economistas ouvidos pela Folha já esperavam o corte de 0,5 ponto percentual. Mas interpretaram a decisão do Fed de formas antagônicas.
Roberto Padovani, da consultoria Tendências, ateve-se aos aspectos positivos. O primeiro deles está ligado ao custo do dinheiro.
Os "Fed Funds" são a base para a definição dos juros de todos os ativos do país, entre eles os títulos do Tesouro dos Estados Unidos (os "T-bonds"). Esses papéis são considerados aplicação de risco zero. Por isso, seu rendimento serve de "piso" para a cobrança de juros na maioria dos empréstimos concedidos no mercado internacional.
Os países emergentes, quando tomam dinheiro emprestado lá fora, pagam esse "piso" mais uma taxa cobrada a título de prêmio de risco. Assim, quando os "Fed Funds" caem, diminui também o rendimento dos "T-bonds". Por consequência, o custo do dinheiro no mercado internacional também se reduz.
Desse modo, o governo e as empresas brasileiras podem tomar empréstimos no exterior mais baratos. Isso é um forte incentivo para o governo baixar ainda mais os juros internamente. Na mesma linha, os bancos e as financeiras têm mais espaço para cobrar juros menores no financiamento de automóveis e aparelhos eletrônicos, entre outros bens de consumo duráveis.
Uma boa medida para acompanhar o custo do dinheiro para o governo e as empresas brasileiras no mercado internacional são os C-bonds, títulos da dívida externa do país mais negociados. Esses papéis tiveram valorização de 0,38% ontem, vendidos a 81,5 centavos de dólar. Isso demonstra a boa expectativa dos investidores estrangeiros em relação ao Brasil.
Os C-bonds também pagam juros sobre os "T-bonds" como prêmio de risco. Essa taxa extra fechou em 6,7 pontos percentuais sobre os títulos do Tesouro norte-americano ante 6,9 pontos do dia anterior.
Marcelo Carvalho, economista-chefe do JP Morgan no Brasil, também enxerga que a queda da taxa básica dos EUA traz mais pontos positivos para o país.
O JP Morgan em Nova York mudou ontem sua expectativa sobre o nível do corte dos juros nos EUA. O banco esperava que a taxa básica cairia até 4,75% até junho, patamar no qual permaneceria até o final do ano. O JP Morgan avalia agora que o Fed reduzirá os juros a 4,25% ao ano até junho.
Carvalho acredita que essa redução incentivará o Copom (Conselho de Política Monetária) a fazer o mesmo por aqui. Para ele, o Copom também derrubará a taxa básica da economia (Selic) com mais intensidade na primeira metade do ano. Ele espera que a Selic saia dos atuais 15,25% ao ano para 13,25% até junho. Depois disso, haveria somente mais um corte de 0,25 ponto no segundo semestre, de modo que a Selic terminasse o ano em 13%.
Octavio de Barros, economista-chefe do BBV, concorda com a postura do Fed, mas percebe os reflexos sobre o Brasil de outra forma. Para ele, é mais provável que os EUA tenham uma desaceleração econômica brusca a ponto de gerar recessão. Em sua opinião, os cortes de juros de agora não seriam suficientes para impedir esse quadro, que traria impactos negativos para as exportações brasileiras.
"Os últimos quatro indicadores econômicos dos EUA ficaram abaixo do que o mercado esperava. Os EUA respondem por cerca de 30% da economia mundial. Você acha que isso não terá reflexos para o Brasil?", pergunta ele.


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