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COMÉRCIO EXTERIOR
Governo tenta selar acordo da Ministerial de Miami, em novembro, e avançar com novas propostas
Brasil defende no México a sua "Alca light"
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O governo brasileiro inicia
amanhã uma nova batalha para
tentar assegurar a chamada "Alca
light", configurada em novembro, na Conferência Ministerial
de Miami da Área de Livre Comércio das Américas.
"Alca light" significa que os 34
países que integrarão a Alca (todos os das Américas, exceto Cuba) procurarão "desenvolver um
conjunto comum e equilibrado de
direitos e obrigações, que sejam
aplicáveis a todos".
Mais que isso, só em acordo bilaterais ou plurilaterais que não
obrigam a todos.
É esse "conjunto comum e equilibrado" que se vai tentar definir a
partir de amanhã na reunião do
CNC (Comitê de Negociações Comerciais), principal organismo
técnico da Alca, marcada para a
cidade mexicana de Puebla.
De acordo com os cálculos do
Itamaraty, a "Alca light" será duramente bombardeada por ao
menos três países, Canadá, México e Chile, que saíram muito insatisfeitos de Miami porque um
acerto de última hora entre Brasil
e Estados Unidos definiu um
acordo desidratado.
Para esses três países -mais os
centro-americanos-, que têm
acordos de livre comércio com os
EUA, o preço de abrir seus mercados já foi pago. Portanto, querem
agora os benefícios, na forma de
abertura dos demais países do hemisfério.
Mas, para que a ofensiva contra
a "Alca light" tenha êxito, seria
preciso que os Estados Unidos a
apoiassem, o que, segundo os cálculos do governo brasileiro, está
fora de questão.
Interesse dos EUA
Não que os EUA não queiram
uma Alca mais abrangente. Mas
parecem ter entendido que o Brasil não vai ceder nessa questão e
que insistir, portanto, levaria a arranhar seriamente uma relação
que, sem considerar o aspecto comercial, é considerada excelente
de parte a parte.
É sintomático que, na edição de
janeiro/fevereiro da revista "Foreign Affairs", mesmo um partidário entusiasmado do livre comércio hemisférico, como Peter
Hakim, escreva:
"Washington deve lembrar,
consistentemente, que seu interesse no hemisfério depende mais
do sucesso político e econômico
de Lula em casa do que de ganhar
a cooperação ativa do Brasil em
qualquer assunto específico, por
mais importante que seja".
Hakim é presidente do Interamerican Dialogue, um dos mais
importantes centros de estudo sobre as relações entre América Latina e Estados Unidos, do qual o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é vice-presidente.
Propostas do Brasil
Para a batalha de Puebla, o Itamaraty vai armado, de todo modo, com algumas propostas ousadas na direção do livre comércio,
claro que nas áreas de interesse do
Brasil.
A primeira delas: aceitar "a eliminação de tarifas para todo o
universo tarifário" em bens não-agrícolas. Ou seja, nenhum setor
industrial brasileiro seria protegido por tarifas. A proteção estaria
apenas no prazo para a eliminação das barreiras.
O Itamaraty propõe quatro
"cestas": desgravação imediata,
em cinco anos, em dez anos e em
mais de dez, esta para os produtos
rotulados como "sensíveis".
Na área agrícola, prioridade número um do governo brasileiro, a
proposta é obviamente mais liberalizante ainda, na medida em
que o Brasil não tem o que proteger nessa área, por ser altamente
competitivo.
Primeiro, o Brasil quer que os
seus parceiros aceitem os acordos
da OMC (Organização Mundial
do Comércio) sobre questões sanitárias e fitossanitárias.
Estados Unidos e Canadá
acham que as regras da OMC são
lenientes demais e acabam usando alegações de assepsia em relação a produtos como o leite para
impor barreiras às exportações.
O Brasil propõe ainda a "eliminação dos subsídios às exportações agrícolas no hemisfério",
uma antiga reivindicação que, no
entanto, agora parece menos distante de se materializar.
Novos alvos
Ocorre que, na carta enviada no
mês passado a seus parceiros da
OMC, o chefe dos negociadores
norte-americanos, Robert Zoellick, diz que chegou a hora de definir uma data para a eliminação
dos subsídios à exportação.
Mas o Brasil irá além em Puebla:
quer a eliminação também de "todas as medidas que distorcem o
comércio de produtos agrícolas",
o que inclui os créditos agrícolas
(muito utilizados pelos EUA).
Quer também mecanismos na
Alca para evitar os efeitos distorsivos dos subsídios utilizados para
exportar para países de fora da Alca. Ou seja, se o frango brasileiro,
por exemplo, perde mercado na
Arábia Saudita porque um país
americano o exporta com subsídios, esse benefício terá quer ser
eliminado ou compensado de alguma maneira.
A proposta brasileira foi encampada pelo Mercosul e indica que a
batalha de Puebla não será unilateral. Ou seja, o Brasil não estará
apenas na defensiva, mas também atacando para obter concessões, em especial dos dois únicos
países ricos da área, Estados Unidos e Canadá.
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