São Paulo, Sábado, 01 de Maio de 1999
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LUÍS NASSIF

Idéias para o segundo mandato

É possível pensar o futuro, em meio ao vendaval político que assola o país? Intelectual de respeito, especializado em história do Brasil, especialmente no período Kubitschek, o ministro da Produção, Celso Lafer, aposta que sim.
Em uma análise recoberta de paralelos históricos, ele julga que FHC poderá cumprir dois papéis simultâneos com seus dois mandatos -o de Campos Salles, que alcançou a estabilização, e o de Rodrigues Alves, que promoveu o desenvolvimento-, com os instrumentos utilizados por um terceiro presidente, o próprio Juscelino.
Do ponto de vista conceitual, os paralelos são interessantes. Sem estabilização econômica é impossível o desenvolvimento, porque os agentes econômicos estão mais preocupados em preservar seus ativos. Conquistada a estabilização, o segundo mandato terá que ser do desenvolvimento.
Em sua opinião, o país experimentou dois programas bem-sucedidos de estabilização -o Paeg, de Castelo Branco, e o Plano Real. E dois bem-sucedidos de desenvolvimento: o Programa de Metas, de JK, e o Segundo Plano Nacional do Desenvolvimento, de Geisel.
O desafio do segundo mandato, segundo Lafer, consistirá em trabalhar em torno de quatro metas: continuação da redução do custo Brasil (com as reformas tributária e administrativa entre outras), redistribuição regional do desenvolvimento, integração competitiva com o mercado industrial e política industrial, da qual a perna fundamental é a política de comércio exterior.

Brasil em Ação
O instrumento para a consecução desses objetivos é o "Brasil em Ação", no qual Lafer enxerga paralelos importantes com o Plano de Metas de JK.
O grande sucesso do Plano de Metas consistiu em trabalhar conjuntamente o macro e o micro, por meio de projetos herdados da antiga Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, e tocados depois pelo BNDE.
No caso do Plano de Metas, o grande nome aglutinador foi Lucas Lopes -pai de Francisco Lopes, o ex-presidente do Banco Central-, que conseguiu juntar pessoas como Celso Furtado a Roberto Campos. O "Brasil em Ação" também se constitui de um conjunto de projetos discutidos com os diversos Estados e com o setor privado. Segue a mesma lógica de aproximações sucessivas, por meio de testes com os próximos setores.
O Brasil em Ação se baseia no conceito de eixos estruturantes, com obras de infra-estrutura visando ligar todos os pontos do país. O Plano de Metas trabalhava com dois conceitos complementares: os pontos de estrangulamento e os pontos de geminação (com potencial de desenvolvimento).
O "Brasil em Ação" trabalha com ambos. Primeiro, as obras de infra-estrutura, resolvendo os pontos de estrangulamento. Depois, o mapeamento de oportunidades de investimento nessas rotas -a partir de um amplo trabalho tocado há dois anos pelos Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)- e que deverá identificar os pontos de geminação. Outro ponto de geminação são as cadeias produtivas -o conjunto de empresas que trabalha em um mesmo ciclo de produção.
O Plano de Metas foi bem-sucedido porque dispunha de um sistema de acompanhamento e implementação, por meio dos grupos executivos. O Brasil em Ação dispõe da figura dos gerentes responsáveis por cada projeto.
O Plano de Metas trabalhava com repasses do BNDES, conseguidos por meio de um adicional de Imposto de Renda. O "Brasil em Ação", com investimentos complementares da iniciativa privada.
Nesse contexto, o papel do Ministério da Produção, segundo Lafer, seria introduzir o elemento micro na análise macroeconômica. Os grandes autores econômicos se preocupam com os macroequilíbrios -câmbio, preços etc. Mas tem que haver a sensibilidade da macroeconomia, para completar o quadro. Sem essa sensibilidade, os erros de diagnóstico são freqüentes. Basta ver o que ocorreu com as discussões sobre desvalorização cambial e inflação. O economista que mais soube casar o macro com o micro -Delfim Netto- foi o que de longe melhor anteviu as consequências da desvalorização.

Os "tempos"
O grande desafio do desenvolvimento, segundo ele, será compatibilizar os diversos "tempos" que compõem a vida nacional, de maneira a superar a crise política e completar a travessia.
Há o tempo financeiro, "on line", exigindo respostas imediatas, diz Lafer. Depois, o tempo da mídia, que se baseia em eventos, não em processos. Na seqüência, o tempo econômico, que tem de respeitar ciclos de produção. Há o ciclo político, também de eventos, e com as características de um presidencialismo forte, dentro de uma Federação E o tempo diplomático, das grandes negociações comerciais.
É nos problemas de administração desses "tempos" que se entende o problema político, no qual o país está enredado.

E-mail: lnassif@uol.com.br


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