São Paulo, quinta-feira, 01 de agosto de 2002

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TRIBUTAÇÃO

Produção de bens e serviços poderia ter metade da taxação atual, afirma deputado autor do projeto que cria o IUF

Imposto único reduz carga fiscal, diz Cintra

MARCOS CÉZARI
DA REPORTAGEM LOCAL

Se o IUF (Imposto Único Federal) estivesse em vigor no país, a carga tributária sobre a produção de 42 setores da economia seria reduzida à metade.
A afirmação foi feita pelo deputado federal Marcos Cintra (PFL-SP), autor do projeto que cria o imposto único, durante debate promovido pela Folha na terça-feira à noite.
O debate foi coordenado por Ives Gandra da Silva Martins, advogado e professor de direito tributário das universidades Mackenzie e Paulista. Participaram também Osiris Lopes Filho, ex-secretário da Receita Federal e professor de direito tributário da Universidade de Brasília, Américo Lacombe, advogado e ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP/MS) e Luiz Zottmann, economista, ex-professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) do Rio e assessor da liderança do PPB no Congresso.
Cintra diz que o novo imposto teria alíquota de 1,7% e incidiria sobre os débitos e créditos feitos no sistema bancário. Ele substituiria outros sete tributos federais, entre eles o IR, o IPI e a contribuição à Previdência Social.
Com a redução da carga tributária sobre aqueles 42 setores, que englobam praticamente toda a produção de bens e serviços no país (veja quadro na página seguinte), as empresas teriam economia com despesas administrativas. Em consequência, os preços finais dos produtos também cairiam, diz Cintra. Haveria ganhos para empresas e trabalhadores.
Segundo o estudo do deputado, a carga tributária sobre aqueles setores está entre 25% e 30%, em média. Com o IUF, ela cairia para cerca de 10% a 15%. Hoje, nenhum setor analisado no estudo tem carga acima de 30%. Com o IUF, nenhum teria mais de 15%.
O objetivo do projeto é acabar com os impostos denominados arrecadatórios, permanecendo apenas os chamados tributos que têm a finalidade de regular a política econômica (casos dos impostos sobre exportação e importação, FGTS e PIS) e as taxas pela prestação de serviços.
Na primeira etapa o imposto seria apenas federal. Num segundo momento, a proposta prevê a possibilidade de que os Estados e municípios interessados possam optar pela adesão à nova sistemática. Para isso, seriam realizados plebiscitos em todo o país.
A proposta de emenda à Constituição (PEC nº 474) já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Após aprovada, uma comissão especial foi criada para debater o tema. A partir de agora serão realizadas audiências públicas.

Críticas
A idéia do IUF foi elogiada pelos participantes do debate, mas também recebeu algumas críticas. Para Lacombe, "é preciso respeitar a Constituição, caso contrário vamos cair em total insegurança legislativa". Para ele, o novo imposto poderia ser um atentado ao sistema federativo.
Zottmann acredita que se a arrecadação pretendida não for alcançada, por uma eventual sistemática de sonegação, o sistema tributário nacional poderia se tornar vulnerável. Isso levaria o governo a ter de tomar outras medidas (aumentar a taxação sobre determinados produtos e serviços) para suprir a perda de receita.
Para Lopes Filho, a proposta abre uma nova discussão no país, pois se trata de uma incidência moderna de tributação. Ele define essa incidência como a grande fonte de tributação deste milênio.

Vantagens
Cintra enumera o que considera as grandes vantagens do IUF: redução da carga tributária sobre cada consumidor; simplificação do atual sistema tributário; corte de custos (para União, Estados e municípios, que reduzirão o número de fiscais, e para as empresas, que não precisarão mais escriturar livros e recorrer à Justiça para contestar tributos); maior produtividade e maior lucro para as empresas; aumento dos salários e redução do "custo Brasil".
Mas não é só isso. Cintra diz ainda que ninguém sonegaria o imposto (dadas as dificuldades para isso e devido à alíquota baixa) nem estaria isento dele (princípio da universalidade), haveria transparência e seria proporcional aos ganhos de cada pessoa.

País está preparado
Cintra diz que o país está preparado para a chegada desse novo tributo. Seu argumento: os brasileiros carregam pouco dinheiro na carteira ou no bolso -menos de 2% do PIB circula nas mãos das pessoas no Brasil, contra 7% nos EUA e 15% no Japão.
Ou seja, hoje, o brasileiro paga quase todas as contas com cheque ou cartão. "É o pagamento por impulso eletrônico", conforme define o autor do projeto. Por isso, o novo imposto, a exemplo do que acontece com a CPMF, seria insonegável, segundo Cintra.
E se as pessoas passassem a andar com muito dinheiro, fizessem os pagamentos com dinheiro, passassem um cheque para outra pessoa, ou seja, se houvesse a monetização da economia, com as pessoas e empresas deixando de usar os bancos, o que ocorreria?
Diante da inevitável pergunta, Cintra é categórico: "Acho difícil que as pessoas deixem de usar os bancos. A alíquota de 1,7% é baixa e não compensa correr o risco".
Outro argumento: hoje as empresas compram do exterior, de outros Estados e de outros municípios. Por isso, diz Cintra, a empresa não vai sair carregando dinheiro para pagar suas compras.

Mudar a Constituição
No início do debate o professor Gandra Martins esclareceu que a proposta do deputado altera o sistema tributário nacional estabelecido pela Constituição Federal. Essa parte compreende os artigos 145 a 156 da Constituição.
Gandra diz que o sistema brasileiro tem cinco espécies tributárias: os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria (todos no artigo 145), os empréstimos compulsórios (artigo 148) e as contribuições especiais (artigo 149).
O professor mostrou preocupação quanto ao comportamento do mercado se o projeto for aprovado na forma proposta e passe a vigorar. Para ele, a alíquota de 1,7%, incidente em sucessivas etapas, poderá ser muito elevada.
"Um planejamento tributário [feito pelas empresas para evitar a intermediação bancária" poderá descompassar a arrecadação do novo imposto. Por isso, entendo que a proposta precisa ainda ser aperfeiçoada."



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