São Paulo, quinta-feira, 01 de agosto de 2002

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Anglo ainda está interessada na Vale do Rio Doce

MATTHEW JONES
CHARLES PRETZLIK
RAYMOND COLITT

DO "FINANCIAL TIMES"

A Anglo American construiu um império garimpando ouro e pedras preciosas, mas a jóia que ainda não está em seu poder é a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), o diversificado grupo de mineração brasileiro.
Diversos bancos de investimentos estudam a possibilidade de uma fusão entre a Anglo e a CVRD. Caso realmente venha a se realizar, essa transação criaria a maior empresa mineradora do mundo.
Embora as propostas ainda estejam apenas em estágio preliminar, a Anglo American continua interessada na CVRD. A empresa foi uma das companhias que participaram sem sucesso da concorrência que privatizou a Vale em 1997.
Tony Trahar, executivo-chefe da Anglo, disse no mês passado em entrevista ao "Financial Times" que não havia negociações oficiais em curso entre as duas empresas. Ele reconheceu, porém, que a CVRD era "uma companhia muito atraente".
Acredita-se que Trahar teria instruído os representantes da Anglo no Brasil a estabelecer relações mais cordiais entre os dois grupos, e, no começo deste ano, ele visitou seu colega na CVRD, Roger Agnelli.
Oficialmente, a reunião tinha por objetivo definir o encerramento das operações de uma pequena joint venture no ramo de cobre com a CVRD. Acredita-se, entretanto, que Trahar tenha na verdade expressado seu interesse em trabalhar em colaboração mais estreita com a companhia brasileira.
A CVRD é considerada como a mineradora mais bem posicionada em termos de recursos geológicos naturais no Brasil, e é um ícone da indústria do país. É a maior empresa mineradora diversificada das Américas, com capitalização de mercado da ordem de US$ 9 bilhões, e maior produtora de minério e pellets de ferro do mundo.
Pessoas próximas à CVRD dizem que Agnelli está considerando as opções estratégicas do grupo, que sofre devido ao alto custo do capital no Brasil, derivado do risco político do país.
Os banqueiros acreditam que a melhor maneira de atenuar essa percepção de risco na CVRD seria por meio de uma fusão com a Anglo, o que reduziria a exposição do grupo ao Brasil. Outras opções em estudo são uma fusão com uma empresa internacional de menor porte ou o desenvolvimento de uma série de joint ventures isoladas com empresas estrangeiras, com financiamento em separado do caixa do grupo principal.
No entanto, a CVRD alega não estar negociando qualquer fusão, com a Anglo ou qualquer outra empresa. "Não estamos considerando nenhuma medida desse tipo", afirmou um porta-voz da companhia.
A Anglo vem tentando diversificar suas operações para além da África do Sul, e ganhar ativos na área de metais básicos e minério de ferro. A companhia sofre distinta desvantagem nesses segmentos com relação à BHP Billiton e à Rio Tinto, suas principais concorrentes.
O grupo reduziu sua desvantagem em termos de cotação acionária com relação às duas empresas desde que transferiu sua sede legal e suas ações para Londres, em 1999. Mas as ações da empresa foram prejudicadas esta semana por um projeto de lei de mineração mais duro do que o esperado apresentado pelo governo da África do Sul, país no qual ainda está concentrada a maior parte de sua produção.
Os analistas consideram que a lógica industrial de uma ligação entre a Anglo e a CVRD seria considerável, mas que os aspectos práticos de qualquer fusão como essa seriam complexos.
O governo brasileiro tem uma participação acionária que lhe garante poder de veto a qualquer decisão na CVRD, e acredita-se que seja improvável que uma venda direta a um investidor estrangeiro seja encarada como aceitável do ponto de vista político. Além disso, os banqueiros não esperam que a BHP, que tem interesse indireto na CVRD, ou a Rio Tinto permitam que a Anglo aja sem sofrer algum tipo de interferência.
A despeito da discrepância em capitalização de mercado entre as duas empresas -o valor de mercado da Anglo, de US$ 20 bilhões, é mais de duas vezes superior ao da CVRD-, os banqueiros dizem que seria possível criar uma empresa com ações cotadas em duas praças, com controle administrativo adequado para as duas partes. É improvável que negociações a esse respeito comecem oficialmente antes das eleições brasileiras para presidente, que será realizada em outubro. Somente depois do pleito é que as duas companhias terão uma idéia mais clara do cenário político.
Se Luiz Inácio Lula da Silva, o candidato à presidência pelo Partido dos Trabalhadores (PT), de esquerda, for eleito, acredita-se que qualquer avanço nas negociações entre os dois grupos seria improvável.
Os observadores do negócio também não têm certeza se a química pessoal entre o exuberante Agnelli e o muito mais reservado Trahar funcionaria apropriadamente.
"É uma transação cheia de dificuldades", disse um banqueiro. "Mas ela acontecerá".


Tradução de Paulo Migliacci


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