São Paulo, sexta-feira, 02 de janeiro de 2004

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Ajuste abre espaço para alta do PIB

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O ano de 2004 deverá ser o melhor para a economia brasileira desde 2000, quando o PIB (Produto Interno Bruto, a soma de todas as riquezas produzidas pelo país) cresceu 4,4%, mas bateu na parede do racionamento de energia em 2001.
Apesar de as previsões apontarem para uma expansão inferior a 4,4%, os analistas afirmam que a economia brasileira passou por ajustes estruturais nos últimos dois anos, que dariam espaço para o crescimento se sustentar por certo tempo a partir de agora.
A mais importante dessas mudanças é o equilíbrio das contas externas, obtido graças a um misto de aumento de exportações e redução de importações decorrente da desaceleração da economia brasileira.
O resultado da balança comercial de 2003 deverá ser conhecido hoje e a expectativa é que apresente um recorde histórico, com superávit acima de US$ 24 bilhões.
Mesmo prevendo um superávit comercial menor para 2004, os economistas afirmam que as contas externas estarão sob controle, o que ameniza uma das maiores vulnerabilidades do país nos últimos anos.
"A partir de 1995, o crescimento foi muito afetado por crises externas. O Brasil sofreu mais que outros países porque tinha déficits muito elevados em conta corrente. Em grande medida, esse problema foi superado, o que nos coloca em situação mais favorável para crescer nos próximos anos", diz Alexandre Bassoli, economista-chefe do HSBC.
A diferença nos dados das contas externas é gritante. Em 2000, o país fechou o ano com saldo negativo de US$ 24,6 bilhões, o equivalente a 4,2% do PIB. Depois de sucessivos déficits, o resultado de 2003 deverá ser positivo pela primeira vez em 11 anos. As previsões apontam saldo próximo de US$ 2,5 bilhões -0,5% do PIB.
O resultado voltará a ser negativo em 2004, mas nada que se compare aos números de anos anteriores. Analistas estimam que a conta corrente será negativa em algo entre US$ 200 milhões e US$ 3,8 bilhões. "Se vier uma crise inesperada, nós seremos atingidos, mas menos que no passado", observa Francisco Pessoa, analista da LCA Consultores.
As previsões de expansão do PIB de 2004 variam de 3% a 4%. O índice é inferior aos 5% apresentados na campanha eleitoral pelo então candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva como uma das condições para criação de 10 milhões de empregos. Mas é superior aos resultados de 2001 (1,3%), 2002 (1,9%) e 2003 (próximo de zero).
Os economistas projetam pequena variação do dólar neste ano e uma inflação sob controle. Para dezembro, é esperada cotação de R$ 3,10 a R$ 3,20. As previsões apontam para um IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) próximo de 6%, o que significa o cumprimento da meta de 5,5% fixada pelo governo, que tem 2,5 pontos de tolerância para cima ou para baixo.
Em geral, os economistas acreditam que as condições para o crescimento em 2004 serão melhores que as registradas em 2000.
Além do ajuste externo, eles apontam como pontos positivos a consolidação da democracia, com a transição para um governo de esquerda, a aprovação da reforma da Previdência e a manutenção do esforço fiscal.
"A demonstração de que o país evoluiu politicamente tira muitos pontos de incerteza", afirma Tomás Málaga, economista-chefe do Itaú. "Há um consenso político de que é necessário manter os ajustes fiscal e externo", completa Pessoa, da LCA. Para Bassoli, do HSBC, o sucesso na transição de governo trouxe redução permanente do risco político do país.

Pedras no caminho
Os dados negativos da equação são a ainda frágil situação fiscal e as dúvidas sobre a sustentação do crescimento a partir de 2005.
A relação dívida/PIB, que já era de 49% em 2000, piorou e deve ter fechado 2003 em torno dos 59%. "A dívida é maior e sua composição, em termos de prazo e indexador, é pior do que em 2000", observa Julio Callegari, da consultoria Tendências.
A perspectiva para a economia pós-2004 dependerá muito do que ocorrer neste ano em termos de investimentos.
Os analistas não acreditam que em 2005 haverá ameaças comparáveis ao racionamento de 2001. Mas afirmam que a expansão do PIB será limitada no futuro se não houver mudanças que permitam o crescimento sustentado. E a mais importante delas é o aumento do nível de investimentos, que está próximo de 18% do PIB, um dos níveis mais baixos dos últimos anos.
Para Málaga, do Itaú, o governo ainda tem um discurso dúbio em relação ao papel do Estado na economia, o que pode afugentar investimentos em infra-estrutura.
Mais que tudo, os economistas esperam que suas próprias previsões não se mostrem distantes da realidade, como ocorreu em 2003. Em janeiro do ano passado, os analistas projetavam expansão do PIB de 2%, segundo pesquisa realizada pelo BC (Banco Central). O mais provável é que o PIB tenha terminado o ano com variação zero ou retração, em consequência das altas taxas de juros praticadas ao longo de 2003.
O IPCA deve ter fechado 2003 com cifra de um dígito (a estimativa do Banco Central é que tenha ficado em 9,1%), inferior aos pouco mais de 11% estimados pelo mercado em janeiro.
Mas a discrepância mais gritante entre previsões e o que de fato ocorreu está na cotação do dólar. Quando o ano começou, a média das previsões apontava para uma cotação de R$ 3,70 para o dólar em dezembro -a moeda terminou 2003 cotada a R$ 2,902, com queda acumulada de 18,1%.



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