São Paulo, terça-feira, 02 de janeiro de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

O que eu posso fazer pelo meu país?


A felicidade e o bem-estar não dependem só de geniais políticas macroeconômicas, por mais importantes que sejam


NOVENTA e nove por cento dos textos publicados nesta página -inclusive os meus- e em qualquer outro espaço para a opinião na grande imprensa brasileira são críticos.
É bom que seja assim. A reflexão crítica sobre o passado ajuda nas decisões futuras. Mas, escrevendo às vésperas do Réveillon e já imbuído do espírito do Ano Novo, lembro-me de uma frase famosa do presidente dos Estados Unidos John F. Kennedy, em 1961: "Não pergunte o que o seu país pode fazer por você, pergunte o que você pode fazer pelo seu país".
Essa idéia faz sentido, porque muitas vezes as críticas partem do pressuposto de que o governo central é o único culpado pelos problemas do país. Não há dúvida de que o governo é o grande responsável por avanços e retrocessos, porque define prioridades e semeia recursos de acordo com suas próprias definições. Mas a felicidade e o bem-estar não dependem apenas de geniais políticas macroeconômicas, por mais importantes que sejam.
A revista "Economist", em reportagem na semana retrasada, aborda o tema da felicidade. Lembra que a renda per capita mundial cresce em média 3,4% ao ano desde 2000. Se esse ritmo continuar, esta será a melhor década da história da economia global em matéria de crescimento da renda média. Apesar disso, seria possível dizer que as pessoas estão mais felizes no mundo? É difícil responder sim. Basta olhar para a insegurança mundial, os conflitos bélicos e os focos de pobreza extrema, fome e miséria.
Certas soluções não dependem apenas de recursos vultosos. Podem ser encaminhadas com meios já disponíveis, a partir de iniciativas individuais, nas regiões, nos Estados, nos municípios, nas empresas, escolas ou entidades variadas.
Na semana passada, por exemplo, os quatro governadores da região Sudeste (empossados ontem em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo), de mãos dadas, anunciaram a decisão de criar um comitê para atuar conjuntamente no combate ao crime. Essa região é a mais rica do país, com 43% da população e 55% do PIB (Produto Interno Bruto), mas também lidera o ranking da criminalidade. A atitude proativa dos governadores é muito diferente daquela que vimos nos trágicos momentos dos ataques do PCC, em 2006, quando autoridades de vários Estados e da União se acusaram mutuamente, cada um tentando fugir da responsabilidade pelo descontrole da situação.
Também é oportuno citar o exemplo do Estado do Espírito Santo. Ao assumir o governo, quatro anos atrás, o governador Paulo Hartung encontrou o Estado quebrado, tomado por corrupção e com alto índice de criminalidade. Em vez de resmungar, ele traçou uma estratégia e fez um plano simples: conseguiu antecipar receitas de R$ 350 milhões, pagou dívidas, pôs em dia os salários dos servidores e impôs administração austera. Hoje, o Estado, saneado, investe 20% de suas receitas, cerca de R$ 1 bilhão por ano. Não por acaso, Hartung foi reeleito com 77% dos votos.
Cito também reportagem ("O Globo", 24/12) sobre o pequeno município de Alto Longa, no Piauí, premiado pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), onde a mortalidade infantil, que era de 50 crianças para cada mil nascidas vivas em 2000, caiu a zero no ano passado. Nenhum milagre. É que a administração municipal incluiu a proteção e a assistência à criança entre suas prioridades e colocou agentes de saúde para percorrer a cidade e a zona rural incentivando as gestantes a fazer exame pré-natal e procurar postos de saúde.
Aí estão, portanto, três exemplos de boas iniciativas, nas áreas de segurança, administração pública geral e saúde. Como essas, há inúmeras outras em regiões, cidades ou corporações. O espírito do Ano Novo sugere que devamos olhar para elas com mais cuidado, porque são exemplos de atitudes positivas, que podem melhorar o nível de felicidade e bem-estar da população, independentemente do sucesso ou do fracasso de eventuais políticas macroeconômicas.
Longe de sugerir trégua nas críticas à política econômica, essas considerações são para lembrar que vale a pena, também, neste novo ano, ter sempre em mente a frase de Kennedy: "O que eu posso fazer pelo meu país?".
BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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