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LUÍS NASSIF
A cerveja e a Cofins
No dia 29 de janeiro à noite, saiu uma edição extra
do "Diário Oficial" com alterações na forma de cobrança do
PIS-Cofins. Há indícios de que
as mudanças ocorridas visaram beneficiar a AmBev.
Há alguns anos a Receita
mudou a forma de tributação
do PIS e da Cofins na cerveja e
em refrigerantes. Em vez de alíquotas sobre o faturamento,
passou a cobrar um valor fixo
sobre cada hectolitro vendido,
independentemente da classificação -se é premium, cerveja
clara ou escura, de primeira ou
segunda linha. Essa modalidade de cobrança é chamada de
"pauta fiscal".
O argumento da Receita é
que inibiria a sonegação. Desde que a medida saiu, os concorrentes denunciaram que beneficiava a AmBev. Como o valor é o mesmo para cada litro
produzido, quanto mais cara a
cerveja, menor a alíquota cobrada. E a AmBev era a cervejaria com a maior quantidade
de produtos mais caros.
Na mudança da Cofins, a lei
10.933, de 29 de dezembro de
2003, permitiu duas formas de
cobrança para a indústria de
cervejas, ambas monofásicas
(cobradas uma vez apenas, na
hora da venda). Poderia ser
por alíquota de 8% sobre o faturamento ou por "pauta fiscal", à escolha do freguês. Essa
possibilidade estava prevista
nos artigos 51 e 52 da lei. Mas o
artigo 53 autorizava o Poder
Executivo a "fixar coeficiente
para redução das alíquotas
previstas nos artigos 51 ou 52
(...) a qualquer tempo", podendo até extingui-las.
Pelos cálculos da Schincariol,
se optasse pela pauta fiscal, pagaria R$ 2,97 por caixa de cerveja; se pela alíquota de 8%, o
valor cairia para R$ 1,04. Não
havia dúvidas de que a alíquota "ad valorem" (que incidia
sobre o valor) era mais vantajosa do que a "pauta".
A Schincariol se preparava
para aderir à alíquota quando
-segundo seus dirigentes- se
ficou sabendo que a AmBev
optaria pela "pauta fiscal". Refizeram as contas e não entenderam a razão da opção. Pelo
sim, pelo não, protocolou em
todos o escritórios da Receita a
possibilidade de mudar de posição, caso houvesse alteração
no valor da "pauta fiscal".
Na quinta-feira, 29 de janeiro, à noite, saiu a edição extra
do "DO". Nele, a instrução normativa 388, da Receita Federal, permitia optar ou pela alíquota ou pelo valor fixo. Já a
instrução normativa 389 elevou de 8% para 14,5% a alíquota para a venda de bebidas
e embalagens. A mesma edição
extra trazia o decreto 4.965, cuja única finalidade foi reduzir
em 45% o valor da "pauta fiscal".
Inverteu-se completamente o
quadro. Sobre cada caixa, o valor do imposto caiu de R$ 2,97
para R$ 1,63 pelo critério da
"pauta fiscal", enquanto subiu
de R$ 1,04 para R$ 1,87 pelo critério da alíquota.
O "DO" foi distribuído no dia
30 de manhã. Quem quisesse
optar poderia fazer até o final
do dia, porque o prazo fatal
-31 de janeiro- cairia em
um sábado.
Gerente de tributos da AmBev, Ricardo Mello explica que
a intenção da Receita -ao definir uma alíquota extremamente alta para a "pauta fiscal" e depois dar desconto no
último dia de opção- visou
dar flexibilidade para poder
mexer no valor sem a necessidade de uma nova lei, enquanto avaliava seus efeitos. Não
entende a razão de ter sido publicado no último dia de opção,
mas sustenta que desde o dia
28 a informação já constava no
site da Receita. Já a Schincariol
sustenta que, no máximo, acenaram com a possibilidade vaga de uma redução na "pauta
fiscal" e que, se não tivesse sido
alertada pelos movimentos da
concorrente, poderia ter sido
alijada do mercado. Haveria
um aumento de 15% no pagamento de PIS-Cofins em relação à concorrente.
No mesmo dia 30 em que
saiu o "DO", duas instituições
já tinham prontas avaliações
sobre os resultados positivos
que as mudanças traziam para
a AmBev, o Morgan Stanley e o
Credit Suisse First Boston. O relatório do Credit Suisse dizia:
"Ontem a Receita brasileira fez
um ajuste na proposta original
(do PIS-Cofins). As empresas
que escolherem a primeira opção (alíquota) terão um novo
aumento na tributação do PIS-Cofins -grande aumento de
carga tributária. As empresas
que escolherem tal opção deverão faze-lo até o final do dia de
hoje e não poderão abrir mão
da escolha do sistema de tributação até maio de 2005. Assim,
o incentivo econômico é para
as empresas que escolherem a
segunda opção".
A conclusão do relatório é
clara: o banco decidiu manter
o rating da AmBev graças: "1)
a essa saída (do pagamento pelo montante fixo); 2) ao potencial de melhora do valor relativo da marca AmBev versus as
marcas B e 3) à recente melhora do "market share".
O relatório do Morgan dizia
que "as mudanças são mais favoráveis para a AmBev do que
pensávamos. Apenas aumentarão a tributação para a AmBev na sua contribuição marginal, enquanto para os concorrentes o aumento de tributação será maior".
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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