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LUÍS NASSIF
Fumaça que pode queimar
O episódio Lula-BNDES -e
seus desdobramentos- é
um caso típico de fantasias que
são fatos e fatos que são fantasias.
Na primeira categoria, enquadra-se a estratégia adotada por
Fernando Henrique Cardoso, como chefe inconteste da oposição.
Sabe ele que, se não cometer nenhum erro, Luiz Inácio Lula da
Silva será imbatível nas próximas
eleições. A estratégia consiste em
minar Lula, batendo reiteradamente na tecla "falta de competência". Lula acusou o golpe, mostrando sua eficácia.
Aí se entra no segundo ponto,
das acusações de corrupção no
episódio de financiamento pelo
BNDES da privatização da Eletropaulo. Deve-se questionar o
modelo adotado para as privatizações, que consistia em o BNDES
entrar com financiamento visando aumentar os lances dados pelos compradores. Mas, em si, nada tem de ilegal ou desonesto.
No episódio Eletropaulo, a venda foi feita em 1998 para a Lightgás, uma sociedade de propósito
específico que tinha como controladora a francesa EDF -"triple
A", na avaliação das agências de
risco.
A modalidade de financiamento concedido é a de "nonrecourse
financing", pela qual o próprio
bem financiado é dado em garantia. Procurando o significado no
Google -conforme sugerido pelo
ex-presidente do BNDES Luiz
Carlos Mendonça de Barros-,
lê-se que é operação cujos riscos
devem ser minimizados com a
adoção de regras prudenciais.
No caso da Eletropaulo, financiou-se metade da empresa, num
total de US$ 896 milhões, com risco dólar (só para grupos nacionais se aceitava TJLP) e com o
BNDES tendo direito a uma comissão anual de 5% -comissão
grossa para operações desse tipo.
Na ponta do lápis, a operação
foi favorável ao país. Somando o
que a AES pagou de juros, amortização e comissão, as garantias
foram adequadas, mesmo no momento de maior baixa das cotações. E São Paulo teve uma redução em uma dívida pela qual pagava IGP mais 12% ao ano. O
problema de aguamento do capital, com remessas expressivas de
dividendos pela AES, é uma outra
história, condenável, mas que
não tem a ver com o financiamento.
Depois, teve uma segunda operação, em 2002, quando o BNDES
vendeu em leilão ações PNs que
tinha da Eletropaulo. Nessa operação, metade à vista, metade a
prazo, a financiada já foi a AES,
que passou a controlar a Eletropaulo, àquela altura com uma
avaliação de risco pouco melhor
que a brasileira.
Da privatização para cá, muita
água rolou. Primeiro, a desvalorização do câmbio em 1999, reduzindo as garantias de 200% para
170% do valor financiado. Segundo, o "apagão", jogando por terra
quase todo o setor elétrico. Terceiro, a crise das eleições em 2003.
Quarto, a própria crise da AES,
que praticamente a alijou do
mercado internacional de capitais.
Há quem queira ver o circo pegar fogo -a oposição processando Lula pelas declarações, a situação pretendo uma CPI para o episódio. Pode até virar incêndio,
mas será em cima de fumaça. Os
problemas da privatização não
passam por aí.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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