São Paulo, sexta-feira, 02 de abril de 2004

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LUÍS NASSIF

Um clássico da Justiça

Decisão proferida pelo juiz Rafael Gonçalves de Paula nos autos nº 124/03 - 3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas (TO), de fins de 2003:
"Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o sr. promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão".
"Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Gandhi, o direito natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional)."
"Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém."
"Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário."
"Poderia brandir minha ira contra os neoliberais, o Consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização européia."
"Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra -e aí, cadê a Justiça neste mundo?"
"Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade."
"Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir."
"Simplesmente mandarei soltar os indiciados."
"Quem quiser que escolha o motivo."
"Expeçam-se os alvarás. Intimem-se."

Estatísticas
O PIB cresceu 1,5% no último trimestre do ano passado. Aí o presidente do Banco Central e o ministro da Fazenda anualizaram a taxa e informaram o distinto público de que os juros seriam mantidos porque, na margem, a economia estava crescendo a 6,1% ao ano e a capacidade instalada poderia explodir. Aí o PIB cresceu 0,9% do primeiro trimestre de 2004. O diretor de Política Econômica do BC diz que "é assim mesmo", depois de um salto no crescimento se segue um período de acomodação. É assim mesmo.

Investigadores
Não há nada mais chato do que o "não te disse?", depois de consumado o desastre. Mas suportei muita crítica por combater CPIs e politização dos procuradores. Hoje em dia até os críticos da crítica admitem que CPIs dão margem a achaques e a politização do Ministério Público ameaça não apenas o próprio poder como a estabilidade do país.
Aliás, já era hora de uma CPI das CPIs. O caso Armando Mellão -o ex-presidente da Câmara de São Paulo preso quando achava um político, usando indevidamente o nome de parlamentares da CPI do Banestado- não é episódio isolado.
Há muita fumaça envolvendo diversas CPIs.


E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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