São Paulo, quinta, 2 de abril de 1998

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LUÍS NASSIF
A corrida estacionária do real

Um exaustivo estudo preparado pelo Departamento de Tesouraria da Placas do Paraná S/A, comparando câmbio e Bolsas de todos os países, permite conclusões relevantes para a análise da situação brasileira.
Em geral, defensores da atual política cambial consideram a desvalorização de 5% a 7% ao ano em relação ao dólar suficiente para, em algum tempo, recuperar o atraso da moeda brasileira, consequência da valorização do real.
Mas não existem apenas duas moedas no mundo -o real e o dólar. Para entrar no mercado americano ou mundial, o produto brasileiro concorre com um sem-número de produtos de outros países. A exemplo da Fórmula 1, não tem nenhuma importância a notícia de que um carro bateu seu próprio recorde de velocidade se, mesmo assim, ele ficou em último lugar na corrida.
As análises em questão levaram em conta apenas a variação nominal das moedas. Desse valor deve-se descontar a inflação interna dos países e a inflação americana.
Mesmo assim, as planilhas preparadas pela empresa permitem conclusões relevantes:
1) Do Plano Real para cá, de 43 moedas analisadas, o real foi a 28ª em desvalorização, com 13,7% no período. A Inglaterra foi o país que mais valorizou sua moeda: 7,5%. Se se agregar a inflação pós-Real, o Brasil provavelmente ganha o título mundial de valorização de moeda.
2) No primeiro trimestre de 98, a desvalorização do real, de 1,9%, foi inferior à de 29 outros países e superior à de apenas 13. Entre esses 13, estão países que já haviam provocado desvalorizações expressivas em suas moedas, como a China, Hong Kong, Taiwan, Cingapura e Tailândia. O que torna o ritmo de desvalorização do real superior a pouco mais de meia dúzia de países.
3) A tesouraria da empresa criou duas cestas de moedas: a OMC (composição proporcional do peso de cada moeda no comércio mundial) e a de intercâmbio Brasil (ponderação de cada moeda no comércio exterior brasileiro). De julho de 94 para cá, a cesta OMC sofreu desvalorização de 19,8%; a de intercâmbio, de 17% -contra 13,7% do real. Ou seja, o real ficou mais caro.
4) Nos três primeiros meses do ano, a cesta OMC desvalorizou-se 4,3%; a de intercâmbio, 2,4% -contra 1,9% do real.
Bolsas mundiais
Levantamento semelhante, realizado junto às 30 maiores Bolsas de valores mundiais, dão um bom espelho da percepção dos investidores em relação a esse quadro.
1) De 22 de outubro de 97 para cá, a Bolsa de Valores de São Paulo ficou entre as sete Bolsas com pior desempenho, com queda de 7,8% -atrás dela, apenas as Bolsas da Tailândia, Chile, Argentina, Coréia, Rússia e Venezuela.
2) As cinco Bolsas de melhor desempenho são de países industrializados, puxados pela Itália (53,7%), Espanha (48,3%), França (31%), Suiça (30,7%) e Alemanha (22,3%).
3) No levantamento do ano, a Bolsa paulista foi a 14ª em desempenho, com alta de 17,2%, o que denota alguma mudança na avaliação externa.
4) O departamento de tesouraria criou quatro índices -o Europa/África, o Ásia/Oceania, o Global e o Américas. Da crise da Ásia para cá, o Europa/África valorizou-se 11,7%; o Global, 2,4%; o Ásia/Oceania, 0,3%; e o América teve queda de 13,7%.
Barganha
Só os muito ingênuos ou críticos sistemáticos podem supor ser possível, em um ambiente democrático, governar ou aprovar reformas sem atender demandas dos parlamentares. O último governo que sentou olimpicamente em cima do Orçamento, sem nada negociar, foi o de Ernesto Geisel, tendo como trunfo o pacote de abril de 77.
Agora, utilizar a retenção de verbas da saúde, especialmente aquelas destinadas ao combate às endemias, como instrumento de barganha política é uma prática desprezível. A alegação de que as prefeituras enviaram dados incompletos não passa de argumento burocrático para justificar o injustificável.

E-mail: lnassif@uol.com.br



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