São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2004

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QUEDA-DE-BRAÇO

Fiesp acusa varejo de ser anticompetitivo; estudo é questionado

Indústria e varejo trocam farpas

MARCELO BILLI
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A perspectiva de um ano de crescimento, depois da estagnação de 2003, já acirra os ânimos de empresários, que iniciam a guerra para engordar os lucros. A indústria saiu na frente e, por meio da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), divulgou ontem estudo no qual acusa as redes varejistas de adotarem práticas anticompetitivas.
Representantes do varejo rebateram as afirmações e questionaram números do relatório.
Horacio Lafer Piva, presidente da Fiesp, afirmou ontem que as redes varejistas se apropriam de parte do lucro das indústrias. "O achatamento das margens de lucro leva à redução do emprego no setor industrial. A conseqüência é a queda dos investimentos e, para a economia, perda de produtividade", explica. Segundo Piva, as exigências comerciais das redes varejistas prejudicam novas empresas e podem ter levado muitas à bancarrota.
Maior rede de supermercados do país, o Pão de Açúcar questionou e ironizou a posição da indústria. "É mais do que razoável que exista um contrato. Discutimos o seu conteúdo por meses até chegarmos a um acordo", afirma César Suaki, diretor comercial do Pão de Açúcar. "Tudo o que é feito, inclusive investimentos em marca própria, tem como foco o bolso do consumidor. Sobre isso, a Fiesp não fala."
Não foi só isso. A federação informou que as cinco maiores redes de supermercados têm 56,6% do mercado. Dados da Abras (Associação Brasileira de Supermercados) mostram que, em 2003, a taxa estava em 39%.
Tem mais: as estatísticas do levantamento da Fiesp, segundo as redes varejistas que analisaram o trabalho, só reúnem dados de metade do mercado de alimentos no país. Isso porque a Abras só levanta dados de parte do mercado, que equivale a R$ 80 bilhões. No entanto, a indústria do setor movimenta R$ 170 bilhões.

Estudo
Realizado pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), sobre a supervisão do ex-presidente do Cade Gesner Oliveira, o estudo analisa a concentração do mercado varejista, as políticas de compras das redes e os efeitos da comercialização de marcas próprias.
As conclusões, de maneira geral, foram que o mercado brasileiro é mais concentrado do que fazem supor os números nacionais. Oliveira argumenta que a melhor maneira de fazer os cálculos é analisando o que ele chama de "mercado relevante", ou seja, áreas geográficas mais limitadas. Assim, enquanto o índice de concentração do setor no Brasil fica em 971, na cidade de São Paulo ele é de 2.177, numa escala que chega a 10.000. Um índice maior que 1.800 nesta escala sugere que o mercado é concentrado.
A concentração dá às redes poder de compra, argumenta o presidente da Fiesp. Com poder de compra, os varejistas podem coagir a indústria com práticas de comercialização que, muitas vezes, podem ser caracterizadas como abusivas.
O estudo relaciona 54 práticas adotadas pelo varejo que, de alguma forma, podem ser enquadradas em alguma categoria de prática anticompetitiva, como limitar o acesso de novas empresas ao mercado, impor preços de revenda ou tentar regular mercados de bens ou serviços. Segundo a Fiesp, os empresários acabam aceitando as exigências porque, caso recorressem aos órgãos de defesa de concorrência, seriam excluídos das listas de fornecedores do varejo, o que poderia, segundo a entidade, levar as empresas à falência.
"A Fiesp até me deu umas idéias, porque tem práticas nesse relatório que desconheço", ironizou Suaki.
O presidente da Fiesp argumentou que a entidade não está sugerindo intervenção do governo. Pelo contrário, diz ele, uma das sugestões que a federação fará aos seus associados será a criação de um órgão privado de arbitragem, formado pelas empresas dos setores industrial e de varejo, para tentar discutir e resolver as divergências entre os setores.
A Abras (Associação Brasileira de Supermercados) não comentou o levantamento apresentado ontem pela Fiesp.


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