São Paulo, domingo, 02 de dezembro de 2001

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INTERNET

Empresário, um dos pioneiros da rede no Brasil, cobrará R$ 350 anuais por serviço sofisticado de correio eletrônico

Mandic deixa iG para enviar e-mail caro

LÁSZLÓ VARGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O sujeito é irrequieto, quase não pára de falar ao celular e evita até sentar quando trabalha. Mas quem conhece o empresário e técnico em eletrônica Aleksandar Mandic, 47, sabe que toda essa ansiedade contribuiu muito para o avanço das telecomunicações no Brasil. O empresário foi um dos responsáveis pela popularização da internet por aqui. Neste mês, pretende novamente mexer com o mercado, ao criar um serviço inédito de e-mails pagos.
A empreitada surpreende justamente pelo momento de apatia que se abateu sobre o setor, após a quebradeira de meses atrás. Mas o empresário parece não se assustar. Foi um dos responsáveis pela introdução do sistema de BBS no país, em 1990, com sua empresa Mandic, que criava redes privadas de computadores, e um dos primeiros a montar uma companhia particular de acesso à internet. Decidiu agora deixar uma das vice-presidências do provedor iG para fornecer e-mails caros, caríssimos. O preço da assinatura anual, somente para enviar mensagens, será superior a R$ 350.
Mas Mandic garante que sua nova cartada dará certo. Segundo ele, o mercado já se acomodou e há espaço para quem quiser descobrir nichos de negócios. Na entrevista abaixo concedida à Folha, o empresário explica como surgiu a idéia de criar esse novo serviço de e-mails, destinado à classe A.
 

Folha - Por que o sr. deixou o iG?
Aleksandar Mandic -
É uma longa história. A idéia do iG foi do Nizan Guanaes, que chamou pessoas famosas para formar a empresa. Ele queria criar uma empresa de grifes. No início, a idéia dele era usar a marca Mandic para alguns serviços. Mas eu só tinha direito de reavê-la em outubro de 2001, pois a havia licenciado por dois anos para O Site. Acontece que de janeiro para cá o iG passou a ter outras prioridades, e a marca Mandic deixou de ser interessante para o portal. Só que ela tem credibilidade, e eu não podia deixar escapar a oportunidade de recolocá-la no mercado. Sentei na mesa com o Nizan e disse que tinha de tocar o novo negócio. E não tinha condições de trabalhar no iG e ao mesmo tempo na nova Mandic. São interesses antagônicos.

Folha - Como será a nova Mandic?
Mandic -
Será uma empresa de correio eletrônico. Vou cobrar uma anuidade, acima de R$ 350, para garantir o fornecimento de um e-mail de alta qualidade. Muitos provedores de internet e e-mail, como o Hotmail, vendem os dados dos seus clientes para empresas, que os utilizam para fazer propaganda. Isso lota a caixa postal e é uma chateação para os usuários. Na Mandic, vou garantir sigilo total dos dados dos nossos clientes. Isso será registrado em cartório. O nosso usuário poderá ter acesso ao e-mails de qualquer lugar do Brasil. E, a partir de março de 2002, de qualquer ponto do mundo. Não precisará de provedor de internet nem nada do tipo. Bastará clicar no nosso discador e a ligação será destinada diretamente à caixa postal, que liberará os e-mails. É um serviço inédito no mundo, para pessoas que precisam de segurança e agilidade no recebimento de e-mails.

Folha - Por que não montar um provedor e um portal que incluam também esse serviço?
Mandic -
Porque não tenho a menor vocação para isso. Um portal precisa ter notícia, e eu não entendo de jornalismo. As empresas que têm vocação para isso já estão aí: UOL, AOL, Agência Estado, iG etc. Elas sabem administrar um portal, e eu não pretendo concorrer com eles. Não tenho vocação para isso.
Também não pretendo explorar o mercado de provedor. Até vou oferecer esse serviço para quem quiser, mas vou cobrar muito caro. Caríssimo. Servirá apenas para emergências. O provimento não me interessa, pois as operadoras de telecomunicações começam a dominar o mercado. Muitos dos provedores de hoje apenas autenticam o usuário, fornecendo a origem do acesso. Não vou ficar autenticando pessoas. Quero oferecer um serviço de e-mail de qualidade. Para isso, vou usar uma espécie de cadeia de revendas.

Folha - Como assim?
Mandic -
Usarei os mesmos recursos de qualquer cadeia produtiva. Vou usar um esquema parecido com a relação que há entre um fabricante e lojas. Vou vender o meu serviço de e-mail a sites, como Livraria Cultura, Submarino e Americanas. Eles terão autorização para vender o meu serviço pelo preço que quiserem. Quer dizer, vão concorrer entre si e comigo mesmo. E eu me comprometo a cobrar o preço mais alto. A vantagem para eles será oferecer um serviço diferenciado. Para mim, ter uma rede de revendedores espalhada pelo país. Afinal, a marca Mandic não é conhecida por várias pessoas. É bom lembrar que 80% do tráfego na internet é de e-mails. Ou seja, estou investindo no principal negócio da rede.

Folha - O sr. está criando um serviço novo justamente em um momento em que as empresas de internet tentam só se manter vivas...
Mandic -
Justamente após o "timbum" da internet, não é mesmo? Da quebradeira geral. De fato, houve uma explosão de empresas do ramo em 2000 e em poucos meses uma falência generalizada. O que ocorreu foi que as empresas de internet queriam crescer de qualquer maneira. Criaram uma guerra de preços, com a esperança de que a publicidade e as taxas de comissão sobre as vendas das lojas virtuais sustentassem o negócio. O que não tem ocorrido. Agora, vou virar o jogo. Vou cobrar mais caro que qualquer provedor para oferecer o melhor serviço de e-mail. Nosso usuário terá direito a poder guardar em sua caixa postal todos os e-mails que recebeu ao longo de um ano, por exemplo. Aqueles que forem deletados serão arquivados durante 12 meses. Com isso, vamos atrair muita gente que já perdeu mensagens sem querer.

Folha - A net é um bom negócio?
Mandic -
Sem dúvida é um bom negócio para quem tiver boas idéias. A internet vai continuar crescendo, no Brasil e no mundo. Mas será uma expansão lenta, sem mais grandes sobressaltos, como no passado. O Mandic Mail é um nicho de mercado que descobri. Não existe nada parecido no mundo. Mas é voltado para usuários da classe A, dispostos a pagar caro por um serviço de qualidade. Será quase uma butique refinada. Um clube com sócios. Vamos oferecer atrações especiais para os usuários.

Folha - Quais?
Mandic -
Queremos ser um clube especial. Aliás, vamos aceitar apenas 50 mil usuários, a fim de não perdermos qualidade no atendimento. Vamos oferecer aos nossos usuários a oportunidade de andar de graça em um Porsche, por exemplo, ou visitar uma fábrica de aviões no exterior. Teremos patrocinadores, como a Credicard Platinum, mas eles não farão nenhuma propaganda nos e-mails nem no site. Só nos eventos especiais, inclusive torneios de golfe. Evidentemente teremos de sortear os usuários premiados, pois é quase certo que vai ter muita gente disposta a andar de Porsche ou viajar para Seattle, nos EUA, ou para a França.

Folha - O sr. procurou investidores para essa nova empreitada?
Mandic -
Estou entrando sozinho nisso. Vou investir US$ 2 milhões no negócio e já gastei US$ 300 mil com a contratação de equipamentos terceirizados. Boa parte do nosso serviço será realizada por terceiros. Terei só 15 funcionários. Coincidentemente, o escritório da nova Mandic será na mesma casa onde comecei com o negócio de BBS, em 1990, em Pinheiros [zona oeste de SP". Descobri que o imóvel estava vago e já o aluguei. Gastei muita grana na reforma. Paciência.

Folha - A nova empresa deve entrar no azul em quanto tempo?
Mandic -
O retorno será rápido. Mesmo porque terei mais agilidade no trabalho. Não precisarei da aprovação de investidores. Já em 2002 quero faturar R$ 12 milhões. Em dois anos quero ter o retorno total dos US$ 2 milhões.


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