São Paulo, quarta, 2 de dezembro de 1998

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ARTIGO

Brasil, a hora da virada

ROBERTO NICOLAU JEHA

O presidente do Banco Central, Gustavo Franco, em reunião com empresários, deu uma boa nova aos investidores estrangeiros.
Depois de anos de câmbio sobrevalorizado; de juros internos capazes de destruir qualquer atividade produtiva; de uma abertura da economia completamente descontrolada; de uma estrutura tributária que cada vez mais onera a produção; de um "custo Brasil" que aumenta a cada dia o fosso cavado pela perda de competitividade do empresário brasileiro em relação ao estrangeiro, finalmente o objetivo que parece ser buscado está a um passo de ser atingido.
O presidente do BC já avisou aos interessados que as empresas brasileiras estão se vergando a todos aqueles fatores e, por decorrência, podem ser adquiridas a preço de banana. Isto é, aquelas empresas que conseguiram resistir; as milhares que já fecharam (pode-se supor por esse tipo de raciocínio) não souberam vencer o desafio da modernidade e apenas mostraram quão ineficientes eram. E não fizeram por merecer outro destino.
O que parece ser uma história surrealista, lamentavelmente, foi dito e publicado na Folha, edição de 21 de novembro, sob o título "Empresa barata atrai capital".
O presidente do Banco Central parecia não estar preocupado. Nem considerou o fato um problema sério que a sociedade brasileira tem a enfrentar.
Não, a notícia, para ele, era positiva. A "limpeza étnica" da empresa nacional estava prestes a ser completada, e o "exército invasor" já podia avançar, pois o custo da operação seria o mais baixo possível. Assim, já se podia comemorar o aumento dos investimentos estrangeiros diretos nos próximos meses. O que me angustia, fora o fato em si, é a resignação, até mesmo o alheamento, com que aquela opinião foi recebida pela sociedade e, em particular, pela maioria da classe empresarial brasileira.
Essa reação revela um grau de alienação preocupante em relação à necessidade de defendermos a existência de um projeto nacional, que minimamente garanta a defesa dos nossos legítimos interesses: as necessidades inadiáveis de voltarmos a crescer econômica e socialmente, de viabilizarmos programas de pesquisa e desenvolvimento tecnológicos próprios, de mantermos o controle sobre as grandes decisões estratégicas do país, de termos uma inserção autônoma no mundo globalizado. Decidirmos, enfim, nosso próprio destino.
Ao mesmo tempo, é importante ressaltar que não adianta ficarmos angustiados e atônitos perante fatos como esse. É preciso que a sociedade brasileira como um todo -trabalhadores, agricultores, industriais, comerciantes, profissionais liberais, intelectuais, todos que queremos um Brasil, não xenófobo e fechado, mas dono do seu próprio destino e inserido no mundo globalizado como uma nação autônoma e democrática- nos mobilizemos a fim de que o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso marque a hora da virada.
Que não apenas a estabilidade econômica e a liberdade democrática, sem dúvida duas grandes conquistas, sejam mantidas, mas que também tenhamos um projeto de desenvolvimento econômico e social que nos permita comemorar a consolidação da empresa nacional. Ela deve dar sua indispensável colaboração, com a empresa estrangeira, ao esforço de transformação do Brasil em uma nação efetivamente moderna, que possa proporcionar a todos os benefícios do desenvolvimento econômico e social.


Roberto Nicolau Jeha, 60, empresário, é vice-presidente e coordenador do grupo de política industrial da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).



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