São Paulo, quinta-feira, 03 de março de 2005

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Má gestão da renda prejudicou os agricultores

CÍNTIA CARDOSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma combinação de queda dos preços das commodities, elevação dos custos de produção e apreciação do real deprimiu a renda dos agricultores, que se viram em dificuldades para pagar as dívidas. Mas a má gestão dos recursos acumulados nos anos de fartura do agronegócio também contribuiu para o quadro.
"Os agricultores têm de adotar uma posição mais madura. Fazer uma poupança nos anos bons para usá-la no tempo das vacas magras. Não se pode jogar todo o ônus sobre o governo", disse Fernando Homem de Melo, professor de economia da USP.
O consultor agrícola Carlos Cogo concorda. "De fato, as margens [de lucro] encolheram, mas os produtores vêm de três anos capitalizados. Muitos deles não calcularam bem os investimentos, comprando maquinário agrícola e arrendando terras de forma desordenada", afirmou.
Na avaliação dos dois especialistas, entretanto, o anúncio da renegociação das dívidas do setor é bem-vindo e necessário. A partir de abril do ano passado, o setor agrícola sentiu o descompasso entre os custos de produção e os preços pagos pela sua produção. O setor de grãos foi o mais atingido. Já os segmentos de açúcar, café, suco de laranja e carnes tiveram impactos bem menores.
O Rio Grande do Sul foi, dizem os especialistas, a região mais afetada. "Além de terem sofrido com a queda dos preços, eles também enfrentaram a seca", afirma Homem de Melo. Ele argumenta ainda que o prolongamento dos prazos de pagamento das dívidas é uma medida justa, mas é importante que seja feita caso a caso, e não de forma generalizada.
A consultora Amaryllis Romano, da Tendências Consultoria, também defende políticas de alongamento de prazos de dívidas. Outra medida que a consultora considera adequada é a concessão de créditos para estocagem. Esse mecanismo evitaria a comercialização excessiva dos produtos agrícolas em momentos de baixa das cotações.

Histórico de renegociações
A pressão dos agricultores sobre o governo para pedir mecanismos de renegociação não é nova.
Em meados dos anos 90, o governo lançou o Pesa (Programa Especial de Saneamento de Ativos) para dívidas com valores acima de R$ 200 mil. Essa renegociação foi condicionada à aquisição de títulos do Tesouro Nacional. Também foram lançados programas para as dívidas de produtores de pequeno porte. Esses programas tiveram um vasto alcance.
À época, o setor agrícola passava por uma forte retração da renda devido à "âncora verde", instrumento que ampliava a importação de gêneros alimentícios para conter a inflação. Em 1996, segundo o consultor Cogo, o estoque da dívida do setor agrícola era de R$ 32 bilhões.
"A paridade cambial de 1994 a 1998 quase levou a agricultura brasileira à falência", disse Homem de Melo. Mas, hoje, o quadro é diferente. "Não há uma crise; há uma acomodação de preços, mas há recuperação de algumas cotações. Não cabe uma renegociação total", afirma Cogo.


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