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ENTREVISTA
Para ministra, país tem alternativas mais baratas para gerar energia, como projetos hidrelétricos na região Norte
Dilma descarta nova usina nuclear até 2010
HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A retomada da construção da
usina nuclear de Angra 3 não deverá acontecer. Pelo menos, não
antes de 2010. Essa é a avaliação
da ministra de Minas e Energia,
Dilma Rousseff, 54.
Segundo a ministra, o Brasil tem
outras alternativas mais baratas, e
a prioridade é a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio
Xingu (PA) e, depois, hidrelétricas no rio Madeira (RO). "Não é
hora de fazer Angra 3, porque você tem outras alternativas renováveis mais baratas", disse, em entrevista à Folha. A decisão é do
presidente da República, que
também ouvirá as opiniões dos
ministérios da Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente.
A ministra informou também
que o governo não irá usar o IPCA
como índice para corrigir o preço
da energia nos contratos entre geradoras e distribuidoras no caso
das novas usinas, que ainda serão
licitadas e construídas. O governo
irá optar por um índice mais ligado ao custo do financiamento da
construção dessas usinas.
Folha - Como está a situação de
abastecimento de energia no Sul?
Dilma Rousseff - O Sul está sob
controle. Deu uma melhorada no
nível dos reservatórios, porque a
carga da Semana Santa é baixa e
também porque entrou energia
das usinas termelétricas de Uruguaiana e de Garabi. Foi um teste.
Folha - Como foi o teste dessas
termelétricas?
Rousseff - Está dando bem abaixo do que deveria dar. Está dando
220 MW para Uruguaiana, quando deveria estar dando aproximadamente 500 MW, e está dando
250 MW para Garabi, quando deveria estar dando 1.600 MW.
Folha - É falta de gás?
Rousseff - No caso de Uruguaiana, a informação que se tem é que
é essa a disponibilidade de gás. Se
eles estão usando gás para outra
coisa, vão pagar por isso. No caso
de Garabi, eles têm contrato com
outras termelétricas, têm contratos na Argentina. Se eles não entregarem, serão chamados a explicar por que no teste deu menos.
Teoricamente, tem que ter o gás,
porque o contrato é firme.
Folha - Qual a alternativa?
Rousseff - Eles vão ter que pagar
uma boa multa, comprar gás e
disponibilizar a energia, caso seja
mandado eles despacharem [gerarem energia] normalmente.
Vão ter que comprar energia e entregar no Brasil, sob pena de inadimplência. Eles serão punidos.
Folha - Até quando o Sudeste poderá continuar mandando energia
para o Sul? Há risco de racionamento por causa do problema com as
termelétricas?
Rousseff - O nível dos reservatórios está bastante alto nas regiões
Sudeste, Nordeste e Norte. Os reservatórios do Sul enchem logo.
Quando chega o período úmido
no Sul, lá para maio e junho, você
já está transferindo energia para o
Sudeste. O fluxo se inverte, sobra
energia no Sul. Nós fizemos simulações e, em todas as séries históricas, nós afastamos o perigo do
racionamento.
Folha - Como estão as perspectivas de leilão de novas usinas? Como o ministério enfrenta o impasse
no licenciamento ambiental?
Rousseff - Nós conseguimos estabelecer uma relação muito produtiva com o pessoal do Meio
Ambiente. Nós recebemos 45
projetos que estavam em fase diferenciada de problemas ambientais. Do total de 13.038 MW, 76%
[9.905 MW] estão resolvidos.
Além dessas, nós temos uma lista
de 17 usinas, que serão licitadas
neste mesmo momento.
Folha - E qual momento é esse?
Rousseff - No início do segundo
semestre, mas primeiro eu preciso fazer o leilão da energia existente, para ver se vai faltar alguma
coisa. Há energia existente suficiente para 2008, talvez falte algo
para 2009, mas precisamos saber
o resultado efetivo do leilão. Para
2010, é só energia nova.
Folha - O indexador dos contratos
entre geradoras e distribuidoras
vai ser o IPCA?
Rousseff - O contrato de geração
está definido como o IPCA para a
energia existente. No caso da
energia nova, nós vamos ter que
ver como é que ficam indexados
os contratos de financiamento.
Nós vamos abrir essa discussão. A
única coisa que nós vamos querer
é que haja um casamento entre o
índice do custo de capital e o [custo de geração] da própria usina.
Folha - Com excesso de oferta, a
senhora acha que o preço da energia vai efetivamente baixar, ou os
aumentos é que serão menores?
Rousseff - Em geral, significa tarifa menor do que a que seria.
Porque o que nós desmontamos
era o que estava entrando de reajuste. Você teria um aumento tarifário calculado pelo governo anterior em, no mínimo, mais de
130% do que está hoje.
Folha - Isso significa, então, que
haverá algum aumento tarifário,
mas não nessa proporção...
Rousseff - Sim, você vai ter sempre algum aumento tarifário, porque você tem que repassar uma
série de custos, inclusive o custo
da energia nova, mas nunca da
magnitude que estava.
Folha - Com esse cenário de excesso de oferta, como fica a construção da usina nuclear de Angra
3? Já há decisão do governo?
Rousseff - Estamos marcando
para a metade de abril uma reunião do CNPE [Conselho Nacional de Política Energética]. O
CNPE se reuniu no passado e definiu três aspectos para a gente
avaliar a condição de Angra. Um
aspecto energético, um estratégico e um ambiental. Ao Ministério
de Minas e Energia foi atribuído o
aspecto energético, em termos do
custo econômico. Ao Ministério
de Ciência e Tecnologia foi dada a
responsabilidade pela avaliação
tecnológica e estratégica, ao Ministério de Meio Ambiente, a característica ambiental.
Folha - E qual é a posição do ministério de Minas e Energia?
Rousseff - Você tem um leque de
alternativas tecnológicas quando
se trata de energia: tem hidrelétricas, tem termelétricas a gás, a carvão e a óleo e tem a nuclear. Do
ponto de vista da variável econômica, não é hora de fazer Angra 3,
porque você tem outras alternativas renováveis mais baratas. Nós
achamos, de uma forma bem objetiva, que ainda estamos com várias hipóteses hidrelétricas que
precedem uma usina nuclear.
Folha - São as hidrelétricas do rio
Madeira?
Rousseff - Madeira, Belo Monte,
na sua nova fase, com 5.500 MW
em duas fases.
Folha - Na parte que diz respeito
ao Ministério de Minas e Energia,
então, o diagnóstico está dado...
Rousseff - Está dado. Ela deveria
ser postergada.
Folha - Para quando?
Rousseff - Nós achamos que para depois de 2010.
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