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Cide é usada para fazer caixa e garantir pagamento dos juros da dívida, diz FGV
JULIO WIZIACK
DA REPORTAGEM LOCAL
O governo anunciou que pretende reduzir a cobrança da Cide, contribuição compulsória
conhecida popularmente como
o "tributo dos combustíveis",
para suavizar os reajustes -de
10% da gasolina e de 15% do
diesel nas refinarias- que chegariam ao consumidor final.
Com essa manobra, o preço
da gasolina nas bombas não sofreria reajuste. Apenas o diesel
teria pequeno aumento. As novas alíquotas ainda estão sendo
estudadas. A medida revigora a
Cide, que pode acabar caso o
projeto de reforma tributária
prevendo o imposto único seja
aprovado pelo Congresso.
Não é a primeira vez que o
governo se vale da Cide para resolver suas dificuldades. Um
estudo feito pela Escola de Direito da FGV (Fundação Getulio Vargas) revela que, nos últimos sete anos, a contribuição
vem servindo à geração de caixa para a garantia do superávit
primário e para financiar gastos que teriam sido realizados
em desacordo com a lei que
criou a contribuição, em 2001.
A Cide tem três finalidades:
subsidiar os preços do transporte de álcool, combustíveis,
gás natural e derivados; financiar projetos ambientais relacionados à indústria do petróleo e do gás; subsidiar os programas de infra-estrutura de
transportes. Para gastá-la, é
obrigatório ter um projeto
aprovado pelo Orçamento.
O estudo da FGV revela que,
em 2007, o governo arrecadou
R$ 7,937 bilhões com a Cide.
Desse total, 20% foram desvinculados para investimentos do
governo federal em outras
áreas. O restante (R$ 6,348 bilhões) deveria ter sido direcionado para as finalidades preestabelecidas pela lei da Cide.
Segundo a FGV, juntos, os
ministérios dos Transportes,
das Cidades, da Educação, da
Defesa, do Meio Ambiente e da
Fazenda e a Presidência da República gastaram R$ 5,483 bilhões. O problema é que, segundo o Siga Brasil, apenas R$ 2,757 milhões tinham previsão
orçamentária.
O Siga Brasil é um sistema de
dados que permite o acesso público às despesas do governo,
disponível no site do Senado.
De acordo com ele, a Presidência da República e a Defesa fizeram aportes de capital em empresas nos valores de R$ 146,2
mil e R$ 350 mil, respectivamente. Pelo sistema, não há como saber quais empresas receberam os recursos da Cide.
Superávit primário
Para os especialistas da FGV,
nos últimos cinco anos o governo utilizou os recursos da Cide
para manter dinheiro em caixa
e cumprir as metas de superávit primário (economia do governo para o pagamento dos juros da dívida pública).
Essa também é a conclusão
do TCU (Tribunal de Contas da
União) que, desde 2005, monitora os gastos do governo com a
Cide. Naquele ano, a Secretaria
de Macroavaliação Governamental apontou, dentre as diversas irregularidades, pagamento de despesas alheias à
destinação constitucional e a
permanência do dinheiro da
Cide nos cofres públicos.
Desde então, o TCU publicou
um acórdão em que o governo
se compromete a cumprir as
regras. Desde então, o governo
passou a gastar com parcimônia. Mas, mesmo assim, ainda
há sinais de irregularidades. O
relatório do TCU do ano passado ficará pronto em junho.
A Folha entrou em contato
com todos os ministérios que
utilizaram os recursos da Cide
em 2007. Pelo Siga Brasil, o Ministério da Educação fez 11 lançamentos de despesas, totalizando R$ 3,4 milhões.
Em nenhuma delas, a prestação de contas foi adequada. Era
possível saber, por exemplo,
que foram desembolsados R$
882,42 mil para pesquisadores.
Mas não havia detalhes sobre o
tipo de serviço prestado.
Em resposta à Folha, o MEC
apresentou informações do
Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal) que, a rigor, seria a mesma fonte do Siga Brasil. Ali aparecem 34 lançamentos no valor de R$ 3,4 milhões.
O que chama a atenção é que,
pelo Siafi, uma das verbas (R$
265,21 mil) teve como destino
uma universidade pública federal, em São Paulo, para ser
utilizado em um programa de
combate à suposta pandemia
de influenza, o vírus da gripe
aviária. Esses recursos saíram
da Antaq (Agência Nacional de
Transportes Aqüaviários).
Outra incongruência: uma
lei específica permite que sejam feitas transferências de
verbas da Cide entre os ministérios. Na prestação de contas
enviada à Folha pelo Ministério dos Transportes, a que pertence a Antaq, não há a transferência de R$ 265,21 mil para a universidade paulista. O TCU
está investigando esses casos.
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