São Paulo, sábado, 03 de maio de 2008

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Petrobras enfrenta dificuldades para explorar campos descobertos há anos

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Enquanto o governo alardeia a descoberta de novas reservas de óleo e gás como a porta de entrada do Brasil, num futuro ainda incerto e distante, no clube dos reis mundiais do petróleo, a Petrobras apresenta dificuldades para explorar os campos já descobertos há muitos anos.
Os dados da empresa mostram que a produção no país está em queda e confirmam que, sem a gordura nas receitas que permitia à estatal absorver a defasagem entre o preço externo dos combustíveis e o cobrado no Brasil, não havia outro caminho a não ser reajustar os valores do mercado interno.
De janeiro a março, a produção de óleo e gás da Petrobras no país caiu 1,4%. Se for considerada também a produção fora do país, a queda é de 1,2%. Segundo analistas ouvidos pela Folha, as justificativas apresentadas pela Petrobras para o desempenho ruim são manutenções de plataformas e de equipamentos. A empresa não se manifestou.
Como a Petrobras é uma companhia com ações negociadas na Bolsa de Valores, a cobrança dos investidores cresce à medida que os resultados diminuem. Pesam ainda a aversão de investidores ao risco diante do quadro de incertezas com a crise financeira mundial.
Essa combinação se reflete no desempenho das ações da empresa no mercado. Apesar da alta do petróleo e das prováveis novas reservas, o papel da estatal acumulou queda de 2,98% entre o final do ano passado e a primeira quinzena de abril. No mesmo período, o preço do petróleo no mercado externo subiu 21,6%.
"Os resultados [da Petrobras] vêm fracos. Não dá mais para ficar brincando, mas a decisão é política porque o governo está preocupado com a inflação", avalia Pedro Galdi, analista de investimento da Real Corretora. Segundo ele, a defasagem do preço da gasolina foi compensada, durante boa parte desses anos em que a estatal não reajustou o produto, pela valorização da taxa de câmbio.

Pressão
Mas a margem de ajuste já foi consumida, e as estimativas do mercado eram que, antes do anúncio do reajuste de 10% nas refinarias, a gasolina custava cerca de 20% menos do que deveria no Brasil; o diesel, 30%. No caso do diesel, o aumento anunciado foi de 15%. Desde 2005 a Petrobras não aumentava o preço dos produtos.
"A própria Petrobras deve estar pressionando o governo para reajustar os combustíveis e aumentar seu lucro, encobrindo a queda na receita por não produzir eficientemente", avalia o economista Dany Rappaport, sócio da administradora de recursos InvestPort.
E realmente pressionou. O presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli, reclamou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e mostrou tabelas e gráficos com os números recentes da empresa. A discussão, no entanto, esbarrava no temor da equipe econômica com a trajetória da inflação.
O ministro Guido Mantega (Fazenda) temia que o reajuste dos combustíveis desse argumentos para o BC justificar novos aumentos dos juros. Por isso, primeiro era preciso encontrar uma forma de tentar neutralizar o impacto desse reajuste no IPCA.

Copom
Um possível reajuste já havia sido incorporado nos cálculos do Banco Central para calibrar a taxa de juros e manter a inflação sob controle. Oficialmente, o Copom (Comitê de Política Monetária) mantém aumento zero em 2008, mas já admitia que as chances de a correção acontecer eram grandes.
Tanta cautela por parte do BC se justifica pelo potencial de atrito que o tema gera no governo. No final de 2004, quando o Copom iniciou um ciclo de alta dos juros, havia um debate semelhante sobre repasses de altas lá fora para os preços internos pela Petrobras.
Na época, o BC destacou na ata da reunião que a correção dos preços poderia ser postergada, mas não evitada, e que o adiamento do reajuste reduzia a eficácia da política monetária. Sob a alegação de ser transparente, o Copom comprou uma briga com a estatal. Desde então, o assunto virou tabu.


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