São Paulo, quarta-feira, 03 de julho de 2002

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LUÍS NASSIF

Desenvolvimento e governos estaduais

O seminário "Políticas de Desenvolvimento", organizado pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) nesta semana, é relevante por acontecer em um período em que começa a ir para segundo plano a visão supersticiosa sobre política industrial.
Das muitas palestras consistentes apresentadas, chamou atenção a de Paolo Gurisatti, professor de economia internacional e comércio da Universidade de Pádua, Itália, que está no Brasil assessorando o Sebrae nacional em sua política de implantação de "clusters" industriais.
O século 20 foi dominado pelo Estado nacional e pelas grandes organizações verticalizadas, inspiradas no modelo fordista. A escola italiana de economia industrial (como foi batizada) inverteu esse jogo. Lá as empresas, municípios e Estados se organizaram em redes horizontais, em distritos industriais, como preconizado por Alfred Marshall em 1910. Criam-se comunidades tecnológicas relacionando-se com comunidades industriais, surgem empresas de fornecedores, criando uma flexibilidade única.
Os distritos dispõem de quatro vantagens básicas.
A primeira, o baixo custo para reestruturação e realocação de recursos.
A segunda, a participação alta e difusa dos investimentos. Há muitas pessoas participando dos investimentos e dos lucros, em uma versão italiana da empresa aberta.
A terceira é o fato de criar um novo tipo de sociedade, em que as pessoas, de força de trabalho, se transformam em empreendedores, levando a uma melhoria da condição e da igualdade social.
Finalmente, essa estrutura permite produzir inovação e reconhecer a propriedade intelectual, por meio de acordos entre produtores e técnicos.
A visão do italiano é que há que ter políticas regionais de articulação de esforços e de definição de objetivos. E cabe ao Estado nacional oferecer suporte genérico para empresas individuais ou "clusters" -e, de forma centralizada, apenas para setores muito verticalizados e de capital intensivo. Para que as políticas nacionais sejam eficazes, há a necessidade de as autoridades locais decidirem seu projeto de desenvolvimento.
E aí se entra em um ponto relevante: discute-se bastante a necessidade de políticas industriais nacionais, mas nada se cobra dos Estados.
Cada presidenciável tem seu grupo de trabalho estudando políticas públicas. Mas não se cobram propostas dos governadores, que são peças-chave dessa equação desenvolvimentista.
Tome-se o caso de São Paulo, uma nação dentro da nação. São Paulo tem os melhores institutos de pesquisa do país, a melhor agência de financiamento de pesquisa (Fapesp), as melhores universidades (USP, Unicamp, Unesp entre outras), centros de excelência tecnológica (Campinas, São Carlos, São José, Araraquara, IPT), um banco estadual (Nossa Caixa), as mais poderosas federações e associações empresariais do país, distribuídas por todo o Estado, o mercado de consumo mais sofisticado. E qual é sua política científico-tecnológica, qual a articulação entre elas, qual o planejamento que permite amarrar as ações dos diversos órgãos, dar-lhes consistência, organicidade?
Os Estados têm que começar a definir e explicitar suas prioridades de desenvolvimento, sua política científico-tecnológica, sua política de atração de investimentos externos. Caberá aos governos estaduais trabalhar na articulação das diversas forças locais, criando fóruns de discussão e ferramentas de implementação de políticas.
Não adiantam recursos do BNDES para pequenas e médias empresas ou para "venture capital" se não houver, em cada Estado, uma estrutura clara de mobilização, análise e aplicação desses recursos.
Por isso mesmo, restringir a discussão de política industrial ao governo federal é abordar apenas parte do problema. Há que envolver os governos estaduais e exigir de cada candidato a apresentação de propostas claras de política industrial e científico-tecnológica. As Secretarias de Ciência e Tecnologia têm que se tornar secretarias de primeira classe e formuladores de políticas ativas de desenvolvimento.

E-mail - lnassif@uol.com.br



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