São Paulo, sábado, 03 de novembro de 2007

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FLOYD NORRIS

Às escuras em Wall Street


Todo desastre financeiro merece um bode expiatório, porque é preciso um culpado pelos maus investimentos

CHEGOU A HORA de Wall Street se expor à luz do sol.
Os mercados de securitização se tornaram críticos para o financiamento nos EUA -de empréstimos corporativos a cartões de crédito- e foram muito lucrativos para os bancos na última década. Só eles pareciam entender o que se passava, e as margens de lucros eram altas. Estava tudo bem para os consumidores também. Os produtos vendidos, uma sopa de letrinhas de SIV, C.D.O., M.B.S. e tantas outras, pareciam possuir a grande virtude de não terem preços reais de mercados.
Ninguém parecia se importar com a falta de informação pública sobre o que eram mesmo esses produtos. Se Moody's, Standard & Poor's ou Fitch dissessem que um título qualquer merecia AAA, era o suficiente. E então eles explodiram.
Agora estamos descobrindo que os bancos de investimento também não sabiam o que estava acontecendo, e eles terminaram com grandes quantias de ativos cujos valores são, na melhor das hipóteses, incertos. "Uma clara melhora na atual estrutura dos mercados de dívidas seria insistir que todas as informações compartilhadas com as agências de "rating" sejam divididas com todo o mercado", diz David Einhorn, administrador de um fundo de hedge.
Um rebaixamento de nota pelas agências de classificação de risco não destrói os mercados de títulos corporativos só porque há muita informação disponível que possam levar outros analistas a tirar suas próprias conclusões. Mas os mercados de securitização entraram em crise quando ficou claro que as agências de "rating" estavam otimistas demais. Quando um título vai de AAA para o lixo, isso não inspira confiança no sistema de avaliação.
Todo desastre financeiro merece um bode expiatório, porque alguém tem que ser culpado quando maus investimentos são feitos. Agora pode ser a vez das agências de classificação de crédito. A SEC (Securities and Exchange Commission) está investigando as avaliações.
É difícil saber qual conclusão pode ser pior. Se as agências violaram suas próprias normas, serão atacadas pelo conflito de interesses existente em receber dinheiro das pessoas que lançaram os títulos. Caso não o tenham feito, serão vistas como idiotas que não conseguiram enxergar quão arriscados esses títulos eram. (Olhando para trás, é claro.) Einhorn diz que a SEC deveria obrigar a publicação das informações que as agências receberam.
Mas os investidores podem conseguir o mesmo se recusando a comprar títulos a não ser que a informação necessária esteja disponível. Wall Street normalmente resistiria a propostas que jogam luz nos produtos esquisitos que cria. As margens de lucros nesses mercados são muito maiores, e o sucesso das securitizações é uma das razões para o índice dos bancos de investimento e de corretoras superar, desde 1998, o S&P 500. Mas essa seqüência está prestes a ser quebrada.
Até agora, o pânico tem ficado restrito aos mercados opacos de securitização. Os mercados de ação mais transparentes têm resistido desde o início da crise, apesar de haver muito nervosismo. Os investidores querem acreditar que o BC dos EUA pode curar todos os problemas ao cortar a taxa de juros interbancária.
Mas foi o colapso do mercado de securitização que tornou mais difícil a obtenção de crédito, e a mudança nos juros não compensou isso. Os EUA podem se considerar o bastião do livre empreendimento, mas ficou muito difícil conseguir uma hipoteca de casa sem algum tipo de garantia governamental.
O velho mercado de securitização morreu porque o que o investidor não sabe pode ser devastador. É difícil que surja um novo, a não ser que algo seja feito para que os investidores profissionais saibam melhor os riscos que estão assumindo.


FLOYD NORRIS é colunista do "New York Times"


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