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OPINIÃO ECONÔMICA
Internet gratuita custa caro
GESNER OLIVEIRA
Todo mundo gosta de receber um bem ou serviço de
graça. Especialmente quando se
trata de algo cada vez mais importante para a cidadania, como
o acesso à internet. O problema é
que, nesse caso, a conta final do
consumidor pode sair muito mais
cara.
A internet gratuita é sedutora,
mas em economia não existem
milagres, ou almoços gratuitos,
como diria o Prêmio Nobel Milton Friedman. Há um custo associado ao provimento de serviço de
acesso à internet que deverá ser
pago de alguma forma, agora ou
no futuro.
As receitas dos provedores de
acesso com publicidade virtual e
comércio eletrônico não são suficientes para cobrir mais do que
30% da operação -na melhor
das hipóteses, 40%. O restante
vem dos pagamentos dos assinantes.
Portanto quando um provedor
oferece serviço gratuito está praticando um preço inferior ao custo.
Em economia antitruste isso tem
um nome: preço predatório, pois
destrói os concorrentes.
O leitor pode perguntar: mas
não ganha o consumidor com os
preços mais baratos, ou, no caso
da internet, com o acesso gratuito? Por que o consumidor poderia
ser prejudicado se ele pode ter
acesso ao universo de informações da rede sem pagar assinatura.
Quando a empresa que pratica
preços artificialmente baixos não
detém poder de mercado, não há
dano. Se o preço estiver artificialmente baixo será praticado temporariamente, porque ninguém
aguenta ficar no vermelho eternamente. A estrutura do mercado
não será afetada e provavelmente
será restabelecido o preço que vigorava antes.
Porém, se o "predador" tiver poder de mercado, poderá bancar o
prejuízo durante o tempo necessário para quebrar seus concorrentes. Depois de ter se transformado no monopolista do mercado, elevará seus preços a níveis superiores àqueles que vigoravam
antes, prejudicando o consumidor no médio e longo prazos.
O caso da internet gratuita no
Brasil é grave precisamente porque só faz sentido econômico
quando levada a cabo por agentes que detêm poder de mercado e
que podem tirar vantagem de flagrantes lacunas regulatórias.
Os provedores gratuitos no Brasil se tornaram atraentes para
grandes operadores de telefonia
fixa por uma razão simples. O
provimento de acesso à internet
gera um tráfego unidirecional
-do usuário para o provedor-,
permitindo, com as atuais regras
brasileiras, capturar receitas de
interconexão de áreas nas quais a
operadora não atua de forma
preponderante. Isso torna rentável bancar um provedor gratuito,
ainda que incorrendo em déficits
na atividade específica de provimento de acesso à internet.
Uma vez que uma operadora se
torna agressiva no negócio da internet gratuita, o jogo entre as
operadoras tem um resultado
previsível e desastroso do ponto
de vista da concorrência. As demais operadoras passam a bancar seus próprios provedores, acirrando a rivalidade entre eles e inviabilizando os milhares de provedores existentes no mercado.
Em pouco tempo, se os reguladores e as autoridades de defesa da
concorrência não adotarem as
devidas providências, o mercado
de provedores estará fortemente
oligopolizado em detrimento da
sociedade e do consumidor.
Ressalte-se que a supremacia
dos provedores aliados às operadoras não decorre de maior eficiência, mas meramente do fato
de que conseguem ficar no vermelho na atividade de provimento
de acesso à internet porque o prejuízo é compensado com as receitas de interconexão.
Se nada for feito, o consumidor
sairá perdendo em todos os momentos. No presente, porque o badalado acesso grátis à internet vai
onerar as tarifas telefônicas e,
dessa forma, transferir renda dos
usuários de telefonia para os de
internet. No futuro, porque o preço do acesso à internet deverá inevitavelmente subir se o mercado
de provedores se tornar um oligopólio de agentes verticalizados.
Gesner Oliveira, 46, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-Eaesp, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail: gesner@fgvsp.br
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