São Paulo, domingo, 04 de fevereiro de 2001

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SOLUÇO AMERICANO

Produtividade industrial e saúde dos bancos encurtam recessão

EUA dão um tempo, tomam ar e voltam no 2º semestre

Associated Press - 31.jan.01
Operadores da Bolsa de Valores de Chicago comemoram o anúncio de novo corte na taxa básica de juros dos EUA, na quarta-feira


MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Embora os ventos anunciem um período pouco promissor para a economia americana nos próximos meses, ninguém acredita que seu ciclo de expansão será bruscamente interrompido ou que o país vá ingressar num período longo e severo de recessão.
Análises privadas e oficiais divulgadas nos últimos dias comparam a atual fase da economia dos EUA a um soluço -capaz de fazê-la parar por um curto espaço de tempo, mas inofensivo aos fundamentos que permitiram o maior período de prosperidade que o país já teve.
Até os analistas mais pessimistas afirmam que, se houver recessão, ela será suave, e o crescimento voltará com vigor no segundo semestre do ano.
As análises obtidas pela Folha foram feitas depois de os EUA terem anunciado que sua indústria entrou tecnicamente em recessão, tendo contraído sua produção por seis meses -ou dois trimestres- consecutivos.
"A economia está obviamente enfrentando problemas. Mas eles são uma resposta típica a uma ação exagerada do Fed (o banco central norte-americano) e não refletem vícios estruturais como endividamento excessivo ou ineficiência industrial", diz Brian Wesbury, vice-presidente da Griffin, Kubik, Stephens & Thompson, uma corretora de Chicago.
Ex-economista-chefe do Congresso norte-americano e considerado um dos analistas mais pessimistas dos EUA hoje, Wesbury prevê que a economia vá contrair muito pouco nos dois primeiros trimestres deste ano, o que colocará o país numa espécie de "recessão indolor".

Segundo semestre
"A contração no primeiro trimestre será provavelmente de 0,5% do PIB e, no segundo, menor ainda. A economia deve se recuperar no segundo semestre."
A lógica de Wesbury, adotada por quase todos os outros analistas, é a de que a nova economia ditou novos padrões de financiamento e de produtividade que ainda vigoram e continuam beneficiando o setor privado.
Diferentemente do que ocorria com as companhias japonesas quando do estouro da bolha daquele país, há dez anos, o mundo corporativo dos EUA não usou empréstimos bancários para crescer nos anos 90, mas sim o capital de risco das Bolsas.
A forma de financiamento usada pelas empresas de tecnologia que floresceram ao longo da década poupou os bancos de carregarem carteiras de crédito "podres".
Como eram intensivas em conhecimento e pobres em bens concretos, tangíveis, essas empresas de tecnologia dispunham de poucos ativos para dar em garantia a bancos e foram obrigadas a seduzir o capital de risco. "Deu certo. Elas acabaram expandindo o mercado acionário, beneficiando também as velhas e tradicionais companhias", diz Wayne Ayers, economista-chefe do FleetBoston Financial Corporation.
Para Ayres, a economia dos EUA não entrará em recessão. Ele prevê crescimentos marginais para o primeiro e o segundo trimestres (0,1% e 0,7%) e acima de 2% para o segundo semestre.
Ayres reconhece que a recessão do setor industrial é um dado extremamente negativo e que, se for um soluço a causa da atual turbulência da economia, "trata-se de um soluço dos grandes". E concorda que, por menores que sejam, as dívidas de empresas com bancos e fundos ainda existem e somam US$ 2,4 trilhões -um terço da economia dos EUA.
Mas ele lembra um dado recente que, pouco divulgado pela imprensa, justificaria seu otimismo.
Em janeiro, a emissão de títulos privados nos EUA atingiu US$ 89 bilhões, um recorde histórico. Pelo perfil dos novos títulos, as emissões indicam que muitas empresas conseguiram trocar seus títulos de curto prazo por papéis de longo prazo, algo que não conseguiram fazer em dezembro.
Outros fatores dão ânimo a investidores e analistas. Os preços do petróleo devem cair ao longo do ano; o governo vai devolver cerca de US$ 80 bilhões em restituições de impostos aos consumidores; o corte de juros começará a afetar a economia real do país, assim como o aperto a estrangulou.
"Não é o fim do mundo. A economia vai se recuperar com a mesma rapidez com a qual desaqueceu depois que os estoques forem vendidos, os preços de energia caírem e os juros mais baixos reabrirem as portas do investimento e do consumo", diz Bruce Steinberg, economista-chefe do banco Merrill Lynch.
Segundo ele, não se pode esquecer que os EUA ainda têm o menor desemprego em 30 anos, apesar das demissões de janeiro.


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