São Paulo, sábado, 04 de maio de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Substituição de importações: lições do algodão

GESNER OLIVEIRA

O termo "substituição de importações" é normalmente associado à indústria, em razão das políticas de industrialização adotadas pelo Brasil e vários outros países em desenvolvimento no século 20.
Isso não impede que haja vários exemplos bem-sucedidos em outros setores, como na agroindústria, que revelam o potencial de melhora de desempenho no comércio exterior do Brasil em uma ampla gama de segmentos da economia.
O algodão constitui um caso interessante no período recente. Conforme descrito no livro "Caminhos da Agricultura", do secretário de Política Agrícola, Benedito Santo, houve modificações estruturais nessa cultura em um prazo relativamente curto.
De maior exportador mundial de algodão em 1985, o Brasil passou a ser o segundo maior importador em 1996. Depois de uma mudança tecnológica radical, novas áreas de produção, especialmente em Mato Grosso, inverteram o jogo.
A quantidade importada chegou a menos da metade do nível de 1996 e o país praticamente atingiu a auto-suficiência em 2001. A produtividade em Mato Grosso chega a 3.700 quilos por hectare, contra uma média no Brasil de 2.860 quilos por hectare.
O estudo inédito "Programas de Incentivo à Agricultura: o Caso do Algodão", do economista Mansueto Almeida, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), extrai lições de política pública do caso do algodão.
Chama a atenção entre os fatores de sucesso o papel da política tecnológica e a vinculação dos incentivos estaduais a critérios objetivos de desempenho.
Ressalte-se, uma vez mais, o papel da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) de Campina Grande, que desenvolveu uma semente de algodão mais adequada às condições de clima e solo do cerrado brasileiro.
Assim como funcionou no caso do algodão, vários outros segmentos são candidatos naturais para uma melhoria significativa de desempenho na produção e no comércio exterior. Segmentos como os de leite, frutas, vinhos e pescados, para citar alguns exemplos, poderiam igualmente apresentar enorme crescimento das exportações e/ou substituição competitiva de importações.
Casos como o do algodão não aparecem espontaneamente. Requerem planejamento e boa política pública para se concretizarem. Além disso, requerem um enorme esforço para conseguir acesso aos mercados mundiais.
É irônico, contudo, que as propostas ingênuas de atender antes o mercado interno para exportar depois terminam por defender o protecionismo dos países ricos, que temem, com razão, o enorme potencial exportador brasileiro.


Gesner Oliveira, 45, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-SP, consultor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br


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