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OPINIÃO ECONÔMICA
O fim do romântico liberalismo
BENJAMIN STEINBRUCH
Novas estatísticas divulgadas na Europa reforçam a
convicção de que são falsas e românticas certas idéias difundidas
no âmbito de uma espécie de sabedoria convencional destes anos
de globalização e abertura.
Dois economistas, um inglês,
Lionel Hubbard, e outro australiano, Brent Borrel, acabam de divulgar um estudo mostrando que
a política de subsídios da União
Européia à agricultura custa ao
mundo cerca de US$ 75 bilhões
por ano.
A informação de que a Europa
subsidia pesadamente sua ineficiente produção agrícola já é há
muito conhecida. Não se sabia,
porém, que a dimensão dos custos
dessa política alcançava um valor
tão gigantesco, equivalente a
mais de 10% do PIB brasileiro.
Para o Brasil, assim como para
os demais países produtores agrícolas, a manutenção desses subsídios representa perdas de bilhões
de dólares em divisas por ano.
Se eles fossem eliminados, haveria benefícios imediatos para nossas exportações agrícolas. Só com
o aumento das vendas de açúcar,
segundo o estudo dos dois economistas, o Brasil teria um ganho
anual de US$ 1,5 bilhão. Haveria
ganhos semelhantes com carnes e
outros produtos agrícolas brasileiros de exportação.
Os dados desse trabalho assustam porque se somam a uma série de outras informações sobre o
protecionismo arrogante dos países desenvolvidos, que atinge pesadamente a produção do Terceiro Mundo, não apenas na agricultura.
Há duas semanas, comentei
aqui um estudo da Embaixada
do Brasil em Washington, mostrando que os americanos taxam
com tarifa média de 45,6% as importações dos 15 produtos que o
Brasil mais exporta. Enquanto isso, para entrar no Brasil, os 15
produtos mais exportados pelos
EUA pagam em média tarifa de
apenas 14,3%.
Para proteger seu mercado e
suas empresas, os americanos
usam todos os meios. Cada tonelada de suco de laranja exportada
para os EUA paga cerca de US$
430 em tarifas. O açúcar paga
236%, o fumo, 350%.
Sobre o aço laminado a quente,
os americanos aplicaram durante
anos medidas antidumping. Há
oito meses, houve um acordo para suspender as medidas, mas o
fluxo normal de exportações até
agora não foi restabelecido porque os EUA não aceitam os preços
brasileiros.
No caso do aço, sem ufanismos,
está na hora de o Brasil pensar
mais seriamente na sua estratégia para ganhar mercado internacional, porque tem a indústria
mais competitiva do mundo. Enquanto no Brasil o custo de uma
tonelada de aço com depreciação
vai de US$ 165 a US$ 175, no Japão esse valor fica entre US$ 190 e
US$ 240 e, nos EUA, entre US$
200 e US$ 250.
Para manter essa indústria ineficiente funcionando, o governo
americano foi obrigado a conceder à siderurgia mais de US$ 23
bilhões em subsídios nos últimos
30 anos. Mesmo assim, desde o
início dos anos 70, a siderurgia
americana teve de ser protegida
por um arsenal que inclui restrições comerciais, cotas, direitos
compensatórios e ações antidumping.
As empresas brasileiras podem
e devem se organizar para ter
uma participação mais ativa no
mercado global. Temos uma
enorme vantagem, decorrente da
qualidade e do suprimento de minério de ferro aliados a nossa logística e expertise siderúrgica.
Mas as empresas brasileiras ainda têm pequeno porte para a concorrência internacional. Precisam investir para crescer e integrar a sua produção com unidades no exterior, mas, para isso, é
indispensável que elas possam
contar com capital a custos mais
baixos.
O Brasil pode e deve liderar o
processo de globalização no setor
siderúrgico e outros, antes que seja tarde demais. O pior que poderia acontecer seria a globalização
passiva, ou seja, a compra de nossas empresas pelos grandes "players" internacionais.
Essas diretrizes não valem apenas para a siderurgia. São adequadas a vários setores em que o
país é internacionalmente competitivo, como mineração, celulose, alumínio, têxtil, calçados e
agrobusiness.
Não deixarei de bater nesta tecla: o Brasil precisa ter coragem
de apoiar de peito aberto o crescimento de empreendimentos nacionais nesses setores, porque são
eficientes. Por que ter vergonha
de financiar, sem subsídios, empresas brasileiras com condições
de participar do jogo global?
Vergonhoso seria oferecer subsídios como os concedidos pela
União Européia à sua ineficiente
agricultura. Ou como os dados
pelos Estados Unidos à sua pouco
competitiva indústria siderúrgica.
Benjamin Steinbruch, 46, empresário,
é presidente dos conselhos de administração da Valepar e da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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